A raiz da corrupção: um debate sobre a reforma eleitoral

Muito tem se debatido por aqui sobre o assunto. Muitos têm até ido para as ruas para protestar contra a dita cuja. Porém, o grande mote dessas campanhas me parece ser: eu, como cidadão brasileiro, estou cansado de corrupção e exijo que a partir de agora todos agentes públicos sejam honestos. Será que funfa?

"Protestar, eu até protesto. Mas na hora da foto, tem que rolar um sorrisinho. Meu melhor ângulo é esse aqui, ó"

Aí, a pergunta que não quer calar é seguinte: como faremos para acabar com ela?

A corrupção é como os fungos e bactérias. Onde se cria um ambiente propício, ela aparece. Acredito que muita gente já parou pra pensar como ela surge. Existem dois grandes fatores que a favorecem: o primeiro é a impunidade. O nosso sistema jurídico legal parece ser muito lento e receptivo a todo tipo do protelação imaginável. Isso favorece quem pode pagar pra ser ver livre de uma condenação final.

O segundo é que as ações dos agentes públicos não são transparentes. O Legislativo brasileiro  esconde suas ações por meio de votos secretos. O executivo está capturado pelo interesse privado, ma isso não é evidente. E em muitos casos nossa mídia não ajuda, pois é seletiva quanto à divulgação de escândalos.

Dentre outros, considero esses os pontos principais. E como podemos ver, a solução seria alterações legislativas de modo a mudar esse cenário. Mas percebem que isso não irá acontecer? De fato, os parlamentares não vão votar uma matéria que prejudique seus próprios interesses.

E é aí que a gente percebe que o buraco é mais embaixo...

Processo eleitoral como a causa primária

Eu poderia citar casos em que empresas privadas e grande grupos econômicos financiaram candidatos em troca de futuros benefícios e atendimento de seus interesses, em detrimento do interesse público, e de forma espúria. Todo mundo ainda se lembra da Operação Caixa de Pandora, da Máfia dos Sanguessugas e Operação Castelos de Areia (essa omitida num típico caso de divulgação seletiva de escândalos de nossa querida mídia nativa).

A lógica é a seguinte: para retornar o benefício recebido com o financiamento de campanha, o político se vale da administração pública para, se possível, repassar mais do que recebeu ao financiador. E geralmente de forma ilegal. E o financiador, por sua vez, retorna isso ao político em forma de mais recursos eleitorais (e pros mais gananciosos, retornos pessoais).

A solução então me parece ser mudar o processo eleitoral, de modo que ele possa trazer pessoas para a política que de fato tenham compromisso com o interesse público e que não tenham o rabo preso com ninguém.

A turminha do compromisso com o interesse público

Assim, essa discussão tem avançado e atualmente temos duas propostas, defendidas por correntes partidárias opostas, que propõem uma reforma eleitoral. Apresentarei a duas e no final me posicionarei sobre qual acho mais adequada.

Financiamento exclusivamente público e voto proporcional misto

Defendido principalmente pelo Partido dos Trabalhadores e por ninguém menos do que José Dirceu, a proposta visa acabar com a financiamento privado direto de campanha e torná-lo ilegal. Atualmente já existe financiamento público de campanha, com o advento do Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos (Fundo Partidário).

Pela proposta, ainda seria possível haver financiamento privado, mas ele iria para um fundo administrado pelo Tribunal Superior Eleitoral e posteriormente, seria divido entre os partidos. Ainda, haveria um teto financeiro de para os partidos, de forma a limitar os gastos com as campanhas eleitorais.

O voto proporcional misto complementaria o financiamento público, ao criar um sistema de dois votos. Um deles dado ao candidato, igual ao modelo atual. O segundo voto é destinado a um partido — que não precisa ser o mesmo do candidato do primeiro voto. A ideia do voto em lista seria a discussão de programas de governo, já que a votação em um partido simboliza a aceitação do eleitor àquele conjunto de ideias para governar o país. Assim, metade dos parlamentares seriam eleitos pelo voto direto e a outra metade pelos candidatos da lista partidária.

Voto distrital puro e misto

Significa dividir o território em vários distritos, que iriam eleger candidatos próprios. O voto distrital misto pressupõe duas votações: metade dos parlamentares são escolhidos por votação majoritária, sendo que a outra metade é escolhida pelo sistema proporcional de listas partidárias. Os defensores dessa proposta pregam também que o voto seja puro para mandatos municipais e estaduais e misto no caso dos deputados.

Essa proposta vem sendo atribuída a candidatos de direita e ao político José Serra, que mantém um link para o movimento em seu site pessoal.

O voto distrital faria com que o eleitor tivesse maior proximidade com seu candidato, já que o distrito seria menor que a atual circunscrição de cada cidadão. Isso faria com que a cobrança em cima do candidato fosse maior, por parte de seus eleitores, promovendo assim uma redução da corrupção.

O Voto distrital no Brasil aconteceria mais ou menos assim

Também alegam que tal sistema reduziria os custos de campanha, já que os candidatos não mais precisariam andar todo o território pelo qual disputam votos.

O melhor e o pior

Sem querer transformar isso num Fla x Flu, mas há pontos negativos em ambas as propostas. Porém o financiamento público tem salvação. O voto distrital, não.

Qual é o defeito da proposta da galera do Dirceu? Dizer que 80% dos recursos públicos eleitorais seriam alocados de forma proporcional aos votos que os partidos obtiveram na eleição anterior para a Câmara de Deputados, que 15% seriam repartidos de forma igualitária entre os partidos que têm representantes na Câmara, e 5% igualmente entre todos os partidos. O que pra mim significa favorecer PT e PMDB. Sendo assim, sou completamente favorável a essa proposta, tirando essa divisão.

O principal ponto positivo é que a proposta serve para acabar com o que pra mim é a maior raiz da corrupção, que é o contato direto entre financiador e eleito, onde o primeiro sempre aparece pra “cobrar a fatura”.

Quanto a proposta do voto distrital, o grande lance dela está na maneira de como os distritos seriam divididos, pois uma certa divisão territorial ajudaria consideravelmente os bons e velhos “coronés” do Brasil a manter sua zona de influência.

Também não está claro de que forma os eleitores iriam se aproximar mais de seus candidatos só porque o espaço territorial de representação diminuiu. Não há nem uma evidência de que isso vá acontecer. A relação entre eleito e eleitor fica mais próxima quando o último adquire mais educação e passa a melhor conhecer os meios de exercício de sua cidadania.

Ainda, não há nenhuma evidência que que o voto distrital vá efetivamente reduzir custos de campanhas significativamente. A proposta não me parece efetiva para reduzir a influência do poder econômico nos resultados das eleições. Ao invés de despesas para percorrer uma grande circunscrição territorial, o candidato irá dispor desse recurso para comprar diretamente o voto do eleitor...

Então eu fico assim, com a proposta do financiamento público de campanha, voto proporcional misto e alterações na distribuição dos recursos eleitorais.

E você leitor, o que propõe?


publicado em 21 de Outubro de 2011, 10:08
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Wagner Menke

Wagner Menke é auditor da Controladoria-Geral da União, mestre em Desenvolvimento e Políticas Públicas e acha que o Brasil pode dar certo (um dia).


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