Natação sem esforço | Mundo interno #4

Uma vez ouvi um ensinamento que dizia: “Faça tudo sem esforço”. Por muito tempo eu achei que esse "sem esforço" era uma forma de dizer para ficar quieto e esperar que tudo chegasse a mim no devido tempo.

Hoje queria compartilhar brevemente uma nova visão que me surgiu dessa sabedoria. O que vou descrever serve para qualquer atividade cotidiana, mas vou usar a natação de longas distâncias como exemplo, pois é algo mais familiar pra mim.

Nadar é um exercício que exige muito do corpo e da mente. Avançamos na água por muitas horas seguidas, sem contato com outras pessoas, sem ouvir, sem sentir cheiros e sem entretenimentos. Mesmo assim, cada braçada é feita sem esforço. Se parece contraditório, explico.

Eu nadando no Lago Paranoá
Eu nadando no Lago Paranoá

Quando algo é feito sem esforço, é porque surge naturalmente, sem que tenhamos que ficar gastando energia reafirmando ou reanimando o movimento.

São necessárias várias horas e dias de treinos, nadando em piscinas, para poder participar de uma prova de maratona aquática. E esses treinos tem de ser feitos sem esforço, pois senão só seriam possíveis com muita disciplina, o que nem sempre dá certo, além de provocar uma sensação ruim de cansaço, luta.

Os treinos de natação brotam naturalmente dentro da minha rotina porque todo o contexto me leva aos treinos: eu me alimento bem para poder treinar, preparo meu material de treino logo pela manhã, coloco a toalha pra secar no dia anterior para que não esteja molhada quando for usar, deixo as medalhas de participação na parede pra motivar, assino uma revista sobre o tema para saber das novidades. Isso ajuda a criar uma paisagem mental na qual o exercício brota como um desdobramento útil, natural.

Da mesma forma, o contexto interno também favorece o esporte, pois quando vou treinar surge energia, alegria, vontade de participar. Como a rotina está estruturada e tem espaço para que os treinos aconteçam, na hora que estou nadando não preciso me preocupar se esse tempo deveria ser aplicado em alguma outra atividade, o que facilita muito a concentração: não estamos gastando energia com preocupações desnecessárias.

Isso não significa que eu não tenha preocupações usuais, como contas, prazos, trabalhos, listas etc — tenho todas essas e várias outras me buzinando a mente. Porém, a prática acontece apesar delas. Dentro do contexto em que estou essas coisas serão resolvidas em seu devido tempo e não no espaço reservado para praticar.

Se os longos treinos surgem naturalmente, a prova final é feita sem esforço. Cada braçada traz a certeza de que aquilo é a melhor forma de aproveitar aquele pedaço de tempo disponível.

Saindo um pouco dos esportes, podemos imaginar que uma moradora quisesse montar um mutirão de limpeza em seu bairro. Isso aconteceria com esforço se a comunidade não ajudasse e ela tivesse de ficar gastando energia, incentivando a todos, toda hora, ou ainda se acabasse fazendo tudo sozinha. Por outro lado, seria sem esforço se o bairro todo comprasse a ideia do mutirão e cada um fizesse uma coisa, com alegria.

Ao final o bairro estaria limpo, as pessoas felizes, a comunidade mais integrada e tudo teria acontecido com trabalho, mas sem esforço.

Sobre a série colaborativa "Mundo interno"

Junto com as pessoas que participam do lugar e também com qualquer leitor ou leitora do PdH que quiser colaborar, vamos publicar alguns textos com essa motivação de mapear e ganhar clareza sobre nossos mundos internos.

A ideia é descrever em primeira pessoa, iluminando por dentro, processos que normalmente são abordados de modo exteriorizado. Será um exercício de introspecção e também de linguagens mais precisas, estimulado empatia e conversas mais profundas sobre qualidades, obstáculos e dinâmicas presentes na maioria de nossas experiências.

Em vez de testar mais um método de produtividade, como posso trabalhar diretamente com os processos sutis de distração, torpor e ansiedade? Se lá fora vejo qualquer que seja o fenômeno, o que vejo quando olho para dentro? Qual o mundo interno de uma empresa? De uma avenida congestionada? De um site como o Facebook ou o PapodeHomem? Quando aparentemente estamos aqui ou ali, onde estamos de verdade?

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Para quem está cansado de apenas ler, entender e compartilhar sabedorias que não sabemos como praticar, criamos o lugar: um espaço online para pessoas dispostas a fazer o trabalho (diário, paciente e às vezes sujo) da transformação.

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publicado em 16 de Maio de 2014, 13:41
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Marcos Bauch

Nascido na Bahia, criado pelo mundo e, atualmente, candango. Burocrata ambiental além de protótipo de atleta. Tem como meta conhecer o mundo inteiro e escreve de vez em quando no seu blog, o De muletas pelo mundo.


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