O desnecessário de tudo que nos faz homens

Terra, posses, dinheiro, virilidade, influência, músculos. Por quê?

Em fevereiro de 1952, Vicente dividia o leito que ocupava no hospital do povoado do Cedro com a esposa, Leontina. Ele, vítima da chifrada certeira de um boi. Ela, visita, estava grávida do sexto filho do casal.

Quando a bolsa que acolhia o menino se rompeu e o trabalho de parto começou, o boiadeiro pôs-se de pé.

Apesar da água nos pulmões, da hemorragia e dos efeitos colaterais que o mantinham na cama há meses, foi atrás do doutor. “Guilherme tá pra fazenda”, disseram quando bateu à casa do médico. Percorreu mais alguns quarteirões até que avistou a sogra, parteira.

Conceição disparou na frente. Vicente, prostrado, chegou bem mais tarde.

Morreu dois meses e um filho depois.

Uma das maneiras possíveis de se olhar para essa história é dizer que ela narra os eventos que cercaram o nascimento do meu pai. Outra é contar que essa é a única passagem que conheço de cor sobre meu avô. E, sinceramente? Sinto que essa é a única de que eu realmente preciso saber.

Se meu pai nem teve a chance de conhecê-lo, eu muito menos. Mas posso fazer um exercício com o pouco que sei. Vaqueiro nascido nos sertões eternizados por Guimarães Rosa, é provável que Vicente pudesse ser retratado como um sujeito forte, corajoso, trabalhador, humilde e que pegava os problemas pelo chifre. Também poderiam descrevê-lo como filho de um amor maldito – entre uma negra nascida do Ventre Livre e um português de olhos claros, prontamente deserdado pelo pai fazendeiro.

Não tenho dúvidas de que tudo isso poderia constar de uma hipotética biografia do meu avô. Mas, mesmo assim, me atrevo a afirmar que o relato que escolhi para abrir esse texto diz muito mais sobre o tipo de homem que ele era e me inspira a ser.

Ao longo dos séculos, homens orbitam repetidamente em torno de alguns espectros de expressões de poder: terra, posses, dinheiro, virilidade, influência, músculos e até mesmo intelectualidade.

Quem é capaz de oferecer o melhor dote? Esse é forte como um touro. Quantos hectares são mesmo? Ele nunca perdeu uma batalha. É filho de quem? Foi ele que colocou o prefeito lá. Que carro você disse que é? É um baita galanteador. Quantos servos o castelo tem? Ah, é pós-doutor pela Sorbonne, né?

Em meio à nossa cegueira coletiva, reproduzimos ad eternum sistemas e ordens sociais que privilegiam os penduricalhos que temos – sejam eles objetos em si ou traços comportamentais adquiridos – em detrimento da natureza das escolhas que fazemos. E as prisões do masculino, com as quais aprendemos a conviver desde pequenos, mal nos deixam respirar.

Não pode chorar. Não pode falhar. Não pode amar outro homem. Não pode levar desaforo para casa. Não pode usar rosa. Tem que prover. Tem que ser forte. Tem que transar. Tem que bater. Tem que ter sucesso.

Só que você já chorou, e não teve que trocar o gênero na certidão de nascimento por conta disso. Certamente já não deu conta de fazer algo como gostaria, e também não ficou menos homem como resultado. Veja bem: alguns ganham menos que as parceiras, ou nem trabalho têm. Muitos declaramos (ainda que sob o efeito do álcool) que amamos uns aos outros em meio a abraços mais longos e apertados que o regimento do Clube do Bolinha permitiria.

A maior parte das estruturas que compõem a masculinidade são, no fim das contas, construções. E se foram erguidas, também podem ser postas abaixo.

Tire de cima dos seus ombros todos os “tem que” e os “não pode”. A ganância pelo sucesso provavelmente jamais irá permitir que você finalmente sinta que chegou lá. Homens que não admitem a hipótese de que não estão tão a fim de transar, por exemplo, perdem uma ótima chance de evitar uma brochada.  

Dispa-se.

Ao invés de botar sua energia para cumprir o papel que lhe foi designado, que tal usá-la para enfrentar o personagem que somos compelidos a interpretar e deixar de lado o desnecessário de tudo aquilo que, supostamente, nos faz homens.

Sem poder, terra, posses, dinheiro, virilidade, influência, músculos e até mesmo intelectualidade, o que sobra?

Seu Vicente não era um expoente em nenhum desses campos, e mesmo assim me ensinou – a cada vez que me lembro da história que me trouxe até aqui – que o homem que a gente é ou tem potência de ser é fruto das escolhas e atitudes que tomamos pelo caminho.

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Você ainda é um pouco desconfiado com essa história de homens que se cuidam? Então leia esse texto que vai te dar uma nova perspectiva sobre o assunto.


publicado em 16 de Maio de 2016, 01:05
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Ismael dos Anjos

Ismael dos Anjos é mineiro, jornalista e fotógrafo. Acredita que uma boa história, não importa o formato escolhido, tem o poder de fomentar diálogos, humanizar, provocar empatia, educar, inspirar e fazer das pessoas protagonistas de suas próprias narrativas. Siga-o no Instagram.


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