A necessidade de pertencer: ficamos melhores quando percebemos a experiência humana compartilhada

Um trecho do livro Autocompaixão: Pare de se torturar e deixe a insegurança pra trás, de Kristin Neff, nos contando como trabalhamos a sensação de pertencimento

Abraham Maslow, psicólogo americano famoso em meados do século
XX, liderou o movimento da psicologia humanista. Ele argumentou
que as necessidades de crescimento e felicidade individual não podem
ser supridas sem primeiro satisfazermos a necessidade mais básica da conexão humana.

Sem laços de amor e carinho com os outros, argumentou, não conseguimos alcançar o nosso pleno potencial como seres humanos. Da mesma forma, o psicanalista Heinz Kohut que desenvolveu um modelo chamado de “psicologia do self” no início da década de 1970, propôs que o “ato de pertencer” é uma das principais necessidades do self.

Ele definiu o ato de pertencer como a sensação de ser um “humano entre seres humanos”, o que nos faz sentir uma conexão com outras pessoas. Ele constatou que uma das principais causas dos problemas de saúde mental foi a falta de pertencimento ou a percepção de que estamos afastados de nossos semelhantes.

A solidão decorre do sentimento de que não pertencemos ou não estamos na presença de iguais. Se você estiver numa festa imensa, se não conseguir se encaixar, é muito provável que ainda se sinta sozinho. A solidão vem desse sentimento de desconexão dos outros, mesmo que estejam apenas algumas polegadas de distância. A ansiedade de falar em público, a fobia número um da nossa cultura, também é causada por medo de rejeição e isolamento. Por que dizem que quando precisamos falar em público devemos imaginar as pessoas usando roupa de baixo? Porque isso nos lembra que o público é vulnerável e imperfeito também, e essa imagem aumenta o nosso senso de humanidade compartilhada.

Mesmo o medo da própria morte deriva, em grande parte, da apreensão sobre a perda de companheirismo, da proximidade e das relações com os outros. E sentimentos de isolamento podem realmente colaborar para o surgimento dos temores. As pesquisas indicam que o isolamento social aumenta o risco de doenças coronárias em duas ou três vezes. Em contraste, a participação em um grupo de apoio diminui a ansiedade e a depressão vividas por vítimas de câncer, aumentando suas chances de sobrevivência em longo prazo. Uma das principais razões da eficácia dos grupos de apoio é que seus membros se sentem menos isolados no seu calvário. A necessidade de pertencer, portanto, é fundamental para a saúde física e emocional.

Os sentimentos de conexão, assim como os sentimentos de bondade,
ativam o sistema de conexão do cérebro. A parte “amizade” do instinto de “cuidar e ser amigo” tem a ver com a tendência humana de ser afiliado, de unir-se em grupos a fim de sentir-se seguro. Por essa razão, as pessoas que se sentem ligadas a outras não ficam tão assustadas pelas circunstâncias difíceis da vida e são mais flexíveis.

Sem dúvida é maravilhoso quando conseguimos que a nossa necessidade de pertencer seja atendida pelos nossos entes queridos, como amigos ou família. Mas se você é alguém que tem dificuldade em manter boas relações, esse tipo de apoio social pode estar faltando em sua vida.

E até na melhor das circunstâncias, nem sempre as outras pessoas são
capazes de nos fazer sentir que pertencemos e somos aceitos. Nos salões
cavernosos de nossas próprias mentes, podemos nos sentir isolados a
qualquer momento, mesmo que as coisas não sejam realmente assim.
Nosso medo e autojulgamento são como viseiras, que muitas vezes nos
impedem de ver as mãos estendidas para nos ajudar. Também podemos
ter vergonha de admitir para aqueles que amamos o nosso sentimento de
inadequação, por medo de que não nos amem mais se souberem como
realmente somos. Assim, esconder de outras pessoas o nosso verdadeiro
eu aumenta a nossa solidão.

E é por isso que é tão importante transformar a nossa relação conosco, reconhecendo nossa interconexão inerente. Se pudermos nos lembrar a cada queda que o fracasso faz parte da experiência humana compartilhada, então esse momento se tornará um episódio de união, e não de isolamento.

Quando as nossas experiências dolorosas e problemáticas são enquadradas pelo reconhecimento de que muitos outros têm sofrido dificuldades semelhantes, o golpe é suavizado. A dor ainda está lá, mas não se agrava pelo sentimento de separação. Infelizmente, porém, a nossa cultura nos leva a perceber como somos diferentes dos outros, e não como somos parecidos.

* * *

Nota do editor:  este texto é um trecho do livro Autocompaixão: Pare de se torturar e deixe a insegurança pra trás, de Kristin Neff, professora no departamento de Psicologia Educacional na Universidade do Texas e pesquisadora de autocompaixão. Ele foi traduzido e publicado pela editora Lúcida Letra, do Vitor Barreto, amigo e autor no PapodeHomem.

É parte de uma parceria nasce do respeito que temos pelo trabalho da editora, que promove um conteúdo de florescimento humano apoiado por nós. 

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publicado em 12 de Dezembro de 2017, 00:00
File

Kristin Neff

Fez doutorado em desenvolvimento moral pela Universidade da California e pós-doutorado na Universidade de Denver. Ensina no departamento de Psicologia Educacional na Universidade do Texas. A história de seu filho autista foi registrada no documentário “The horse boy”.


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