As finais da NBA: Cavs x Warriors e o tira-teima que nasce com jeitão de clássico eterno

Terceira final consecutiva entre Golden State Warriors e Cleveland Cavaliers, feito inédito na liga americana de basquete, começa hoje


Toda saga de respeito tem um terceiro capítulo. Não seria diferente com a NBA.

Por sorte nossa, o inevitável novo episódio da saga Cavs x Warriors começa nesta quinta (1°).

Desde outubro, antes da maratona de 82 jogos da temporada regular ter início, todos os holofotes estavam voltados para esse possível acontecimento. A chegada de Kevin Durant ao timaço de Oakland e uma possível final contra Lebron James e Kyrie Irving estava cravada por 11 entre 10 especialistas.

Em 2015, o Golden State acabou com sua seca de títulos ao bater a franquia de Ohio.

No ano passado, foi a vez de uma inédita virada de Cleveland, após sair perdendo por 3x1 na série. Era o primeiro título de Lebron com seu time do coração. Era a primeira taça nacional a entrar no salão da equipe.

Dois meteoros estão prestes a entrarem em rota de colisão.

A astronomia chega a aguardar ansiosamente por até 10 mil anos para ver uma colisão estelar desse tipo.

E lá vamos nós para o desempate.

Com vocês, duas campanhas lendárias

Arte: Dai Tamura

Com a garantia da óbvia primeira posição no Oeste, o Golden State atropelou todo mundo nos playoffs, acumulando 12 vitórias em 12 partidas. Portland Trail Blazers, Utah Jazz e San Antonio Spurs comeram poeira, exatamente nessa ordem. Não são os poucos que vão dizer que o embate com a equipe texana acabou sem chance nenhuma de zebra após a contusão do ala Kawhi Leonard, simplesmente o melhor atleta da equipe de Gregg Popovich.

O Cleveland Cavaliers, por sua vez, tornou as coisas mais interessantes no outro extremo do país. Após ser ultrapassado pelo Boston Celtics do incrível Isaiah Thomas na fase regular e cobranças públicas de Lebron ao general manager e aos colegas de equipe, o foco voltou para as decisões.

Quatro vitórias contra o Indiana Pacers, do astro Paul George, com diferença de 16 pontos no acumulado. Daí vieram passeios seguidos contra um Toronto Raptors (eterno amarelão) sem Kyle Lowry e uma interessante série com os Celtics.

No fim, no agregado, 12 vitórias e uma derrota. Tranquilidade total.

É a primeira vez que duas equipes chegam tão dominantes para o confronto final.

A defesa que cria um ataque coletivo de cinema...

Arte: Dai Tamura

É fácil se deliciar com o talento ofensivo de Kevin Durant, Stephen Curry, Klay Thompson e Draymond Green. O que se esquece com certa frequência é que tudo isso só vem porque o jogo de contra-ataques rápidos e transições malucamente belas surgem das ações defensivas. Como se fosse fácil melhorar o que é quase perfeito, neste 2017 os Warriors são ainda mais impenetráveis. A equipe cede apenas 99,1 pontos por 100 posses adversárias, na dianteira do Milwaukee Bucks (101,5), a segunda mais dura defesa dos playoffs, e ainda mais distante do outros 14 times classificados.

E isso tudo tendo um errático jogo defensivo dentro do garrafão. Na fase regular, os Warriros foram a 29ª pior equipe a conseguir recuperar sobras de bola em sua tabela, ficando apenas à frente do New York Knicks. E, amigo, se você é comparável à franquia de Carmelo Anthony e Phil Jackson em algum quesito é porque é melhor deixar os olhos bem abertos (desculpe, amigo Jader Pires).

O rebote é justamente um dos pontos que o Cavs pode - e deve - explorar. Tristan Thompson, dos Cavs, deve estar babando de tanto apetite para fazer bonito na estreia de hoje. JaVale McGee e Zaza Pachulia, do GSW, serão os responsáveis por tentar não criar um desequilíbrio capaz de dar a série ao Cavs. A missão é dura.

… Mas que pode ter sérios problemas com Lebron James

Arte: Dai Tamura

Pode-se reclamar de sua eterna mania de escolher a dedo quem vai entrar em quadra com ele, mas é inevitável dizer o óbvio: Lebron James é o verdadeiro King do rolê. Ninguém se mostra mais dominante na NBA na última década do que o filho pródigo de Akron, periferia de Ohio.  É a sétima final consecutiva de Lebron, a oitava na carreira.

Nestes jogos decisivos - o momento que mais importa -, James vem mais uma vez voando baixo. Nas três primeiras rodadas dos playoffs, James tem média de embasbacantes 32,5 pontos, 8 rebotes, 7 assistências, 2,2 roubadas de bolas e 1,4 toco por partida. A eficiência também é de fazer corar: 56,6% nos arremessos de quadra e 42,1% da linha dos três pontos.

Isso sem contar os intensos esforços na defesa, os 32 anos e os 5.995 pontos em playoffs sem nenhum sinal de desacelerar. Na brincadeira, ficou um tal de Michael Jordan para trás.

Golden State sonha que Draymond Green e Kevin Durant possam, ocasionalmente, conter as jogadas individuais do astro maior dos Cavs.

Para sobreviver, um dos cenários possíveis para o Golden State é reduzir o papel de James ao de maestro. Mas nada garante que não será fatal.

Geniais e indomáveis

Arte: Dai Tamura

Por mais que seja capaz do impossível, Curry também é conhecido - e ficou até marcado no ano passado - por desperdiçar bolas fáceis e cometer erros não forçados ao tentar fazer firula. Mas, sem sombra de dúvidas, o maior problema fica na tabela defensiva, uma das menos produtivas da liga toda.

O Cavs, que vai pegar a melhor defesa da liga, fechou a temporada regular como apenas a 22ª defesa (108 pontos cedidos por 100 posses adversárias). Tudo melhorou nos playoffs, ficando atrás apenas de Warriors e Bucks, com média de (104,6 pontos sofridos por jogo).

Parece que o grande segredo aqui vai ser quem Lebron James vai vigiar de perto: Curry ou Durant.

Vai um legado impecável aí?

Arte: Dai Tamura

“Eu fiz a escolha 100% certa, perdendo ou ganhando [a final]”. Palavras de Kevin Durant, o craque que decidiu mudar-se para o lado dos vencedores, trajetória que é extremamente mal vista entre os torcedores americanos.

“Sinto que aqui é o lugar que eu deveria estar. Me orgulho de tudo que fiz antes de chegar aqui. Mas, estou aqui agora e sinto que é o melhor lugar para estar. É aqui que deveria estar neste ponto da minha vida. Estou apreciando cada pequeno passo disso tudo”.

Mas é inevitável dizer que Durant sai menor da temporada se não se mostrar decisivo agora, quando mais importa e o mundo parou para ver. E ele vem bem, obrigado: 55,6% de acerto nos arremessos e 41,7 do meio da rua no mata-mata. Neste ano, já na equipe da Califórnia, Durant apresenta média de 28,5 pontos por jogo nos dois embates contra o Cavs, com 51,3% de acertos.

Quatro vezes MVP, Lebron continua sua busca pessoal pelas marcas de Michael Jordan, seu eterno ídolo. O camisa 23 dos Bulls encerrou a carreira com 6 vitórias em 6 finais disputadas, incluindo aí alguns dos lances mais clutch da história. Lebron tem agora mais uma chance de cravar seu lugar no Top 5 eterno da liga ao bater duas vezes uma equipe tão absurda quanto o Warriors. Mas pode também acabar sendo contestado se ver seu recorde em finais cair para 5 vices para 3 anéis.

Os fantasmas se divertem

Arte: Dai Tamura

5 minutos no relógio, posse com o camisa 30, o MVP inconteste da liga. Warriors na frente por um ponto na partida decisiva, no jogo 7. Bola desperdiçada num erro não forçado ao tentar fazer um passe por trás das costas. Curry, aliás, esteve bem abaixo de sua capacidade na série inteira. Steve Kerr grita do banco, mas nada pode fazer: o Warriors não pontuaria até o final daquele jogo. Curry tomaria uma bola de três de um Irving matador. E nascia aí o hit do Twitter: “blew a 3-1 series lead”.

Curry ainda acusa o golpe, mas  garante que não vá alterar em nada a forma que joga. “Sim, ainda penso naquele turnover. Mas pensando naquele jogo, é engraçado porque eu conheço o conceito de como fazer a jogada correta, fazer uma jogada simples, entender que estamos num momento decisivo e a diferença entre vencer um campeonato e não poder fazer uma daquelas jogadas. Ainda assim, no começo da pré-temporada deste ano eu usei um behind-the-back pass porque tenho confiança que posso fazer e não vou mudar isso”.

O maestro da região de San Francisco está mais que certo. Nos playoffs, ele vem como médias de 28,6 pontos, 5,6 assistências, 1,9 roubo de bola e 3,3 turnovers por jogo. A capacidade de acerto nos arremessos segue impressionante: 50,2% de quadra e 43,1% de longe.

Os sonecas

Arte: Dai Tamura

Klay Thompson, inesperadamente, mesmo com a varrida geral do GSW, não tem sido aquele brilhante irmão (quase) gêmeo de Stephen Curry. Seus arremessos estão caindo bem abaixo da média, com 38,3% de quadra e míseros 36,4% de longe, a especialidade do camisa 11.

Se no ataque as coisas não têm funcionado como antigamente, o Golden State conta, e muito, com Thompson na defesa. É dele a missão ingrata de tentar parar Kyrie Irving, o homem da bola matadora de três pontos que enterrou a equipe do norte da Califórnia na temporada passada.

O eterno descamisado J.R. Smith é outro que não tem conseguido repetir suas melhores atuações. Nos playoffs ele acumula a baixa média de 6,6 pontos, 2,6 rebotes e 0,8 assistências. As melhores partidas vieram com 13 pontos, nos Jogos 3 das séries contra Indiana Pacers e Boston Celtics. Bom lembrar também que J.R. vem de contusão, ficando boa parte da temporada fora até mesmo do banco de reservas.

Alguém consegue duvidar que um deles pode acabar decisivo justamente agora?

O palpite

Golden State Warriors e Cleveland Cavaliers

O site de estatísticas e pesquisas FiveThirtyEight's dá chances de título para o Warriors na casa de 90%, partindo de análises dos números mais diversos, mas principalmente na capacidade até aqui de se mostrarem capazes de brecar lineups de grandalhões ou de velocistas. Curry + Thompson + Durant + Green parece uma combinação potente o suficiente para fazer frente aos donos do título. A sede revanche vai pesar também.    

“Essa coisa de azarão é engraçada para mim porque, ao final do dia, somos nós que defendemos o título”, fez questão de lembrar o pivô Kevin Love, no sábado, após o treino.

A chave para o Cavs, que reforçou demais o elenco e agora é também uma artilharia pesada da linha dos 3 pontos, vai passar por limitar as transições do Warriors, tirar a velocidade do jogo e tentar fazer com que o Warriors jogue pouco junto e exagere no isolation. O já citado garrafão esburacado do Golden State parece ser um ponto óbvio a ser dominado.

Transformar o embate num duelo físico parece fazer sentido para o equipe de Tyronn Lue mais uma vez. Seria uma imensa surpresa que a série terminasse em 5 ou até 6 jogos. O terceiro round Cavs x Warriors leva todo jeito de ser épico e jogado palmo a palmo, decisão a decisão, troca por troca. Os bancos de reserva vão contar demais também, visto que não se espera nada diferente do que jogos apertados. Ainda assim, se precisar apontar um vencedor, ficaria com as estatísticas e com os Warriors.

São talentos demais reunidos com possibilidades mil de combinações para enfrentar as marcações e os matchups do Cavs. É esperar o Sistema Solar explodir, noite após noite.

Vejo vocês por aí.


publicado em 01 de Junho de 2017, 00:00
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Rafael Nardini

Torcedor de arquibancada, vegetariano e vive de escrever. Cobriu eleições, Olimpíadas e crê que Kendrick Lamar é o Bob Dylan da era 2010-2020.


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