As mídias sociais estão tornando as pessoas narcisistas?

As redes sociais tornam as pessoas narcisistas ou as pessoas narcisistas usam mais as redes sociais?

#'s, selfies, likes, emoticons, views. Nessa fase de começo/final de ano todo mundo pesa um pouquinho mais a mão nas redes sociais, né não?

Mas enquanto a gente presencia um comportamento geral cada vez mais voltado para as redes e, consequentemente, o mundo virtual, fica a pergunta: As mídias sociais estão tornando as pessoas narcisistas?

Esse artigo do W. Keith Campbell no The Conversation, originalmente publicado em inglês e traduzido para o português por Julia Barreto, se propõem a esclarecer alguns desses pontos. É interessante pensar como isso tem afetado o nosso comportamento e o das pessoas em torno de nós.

A gente se vê nos comentários para continuar a conversa.

As mídias sociais estão tornando as pessoas em narcisistas?

Houve um aumento massivo no uso de mídias sociais — de quase não existente quinze anos atrás, elas agora ocupam uma grande parcela de nossas vidas e das vidas de nossas crianças.

O Facebook, por exemplo, exibe cerca de um bilhão de usuários por dia.

Essa explosão de mídia social levou a muitas mudanças culturais, sociais e econômicas.

Narcisismo — ter uma visão inflada de si mesmo — se tornou um importante tópico de interesse de pesquisas, e também de preocupação.

A mídia social está se tornando uma válvula de escape para indivíduos narcisistas se autopromoverem? E será que ela está nos tornando e tornando nossas crianças em narcisistas?

Procurando atenção

Algumas pessoas usam suas contas nas redes sociais como plataformas de autopromoção — lugares para buscar atenção e admiração. Outras ocupam uma quantidade desproporcional de espaço nos feeds de notícias das mesmas.

Esses “amigos” que se gabam de como suas vidas são incríveis — repleta de imagens e hashtags — acabam parecendo pelo menos um pouco narcisistas.

Até os nomes e slogans de vários sites de mídias sociais parecem reproduzir essa onda narcisista, ou pelo menos individualista.

Youtube: “trasmita-se”. Twitter: “o que você está fazendo?”; e “iPod”, “iPad” e “iPhone” (i = eu).

A revista Time nomeou “Você” a pessoa do ano em 2006, e até incluiu um espelho e um computador na capa.

O Facebook tirou seu nome dos livros que algumas escolas publicam com o nome e rosto de todos os seus alunos. E o LinkedIn foi projetado para relações de negócios (os “links”).

Isso levou nossa cultura a se tornar consideravelmente mais autocentrada.

Designers de hardware criaram câmeras que tiram fotos de seus donos, e a selfie dominou o cenário. Selfie foi considerada a palavra do ano pelo Oxford English Dictionary em 2013. (A primeira pessoa que usou a palavra “selfie” na verdade foi um australiano bêbado em 2002 que tirou uma foto do seu lábio sangrando depois de cair para mostrar para seus amigos.)

Hoje temos 100 milhões de pessoas em mídias sociais como o SnapChat tirando selfies, tratando-as com filtros e as mandando para amigos.

Os pesquisadores seguem essas tendências da melhor maneira possível, mas eles estão sempre uns dois anos atrasados.

Narcisistas se autopromovem mais

Narcisistas tendem a se autopromover mais. Shutterstock

Um estudo de 2008 sobre narcisismo e Facebook achou evidências que indivíduos mais narcisistas se autopromoviam mais no Facebook e tinham mais “amigos”.

Essa descoberta é consistente com a expectativa de muitas pessoas — indivíduos narcisistas se dão bem em ambientes com relacionamentos superficiais e oportunidades de se autopromover.

Isso não quer dizer que o Facebook só serve para o narcisismo — mídia social é uma ferramenta que pode ser usada para formar e manter relacionamentos mais íntimos, aprender coisas novas, ou só para oferecer entretenimento. Mas também é um ambiente atraente para narcisistas fazerem suas coisas.

Essa descoberta tem se sustentado nos estudos de todo o mundo, com o narcisismo predizendo a autopromoção e o número de conexões.

Mais recentemente, pesquisadores estão abordando a questão do narcisismo e selfies.

Vários pesquisas descobriram que indivíduos narcisistas tiram mais selfies, passam mais tempo nas mídias sociais, se sentem bem sobre isso, e fazem um pouco mais de autopromoção (por exemplo, mostram mais fotos do corpo e mais selfies sozinhos)

Eles também tendem a ser bem integrados nas redes sociais, tendo um grande número de amigos e seguidores. Em geral, homens são um pouco mais narcisistas que mulheres, mas descobrimos que homens e mulheres narcisistas usam a mídia social de formas semelhantes.

As mídias sociais aumentam o narcisismo?

A questão mais difícil é se a seta aponta no sentido contrário. Isto é, o uso das mídias sociais leva ao narcisismo?

Essa se provou uma pergunta muito mais difícil de ser respondida. Quando estudamos, num primeiro momento, as mudanças no narcisismo com o tempo, parecia que o narcisismo e o uso das mídias sociais podiam estar acelerando juntos.

Mas esse dado é correlacional e não nos diz nada a respeito do uso das mídias sociais, e portanto também não nos diz muito sobre como as mídias sociais influenciam seus usuários.

Desde então, pesquisadores tentaram algumas estratégias diferentes.

Uma é experimental. Por exemplo, você pega dois grupos aleatórios, faz com que um deles trabalhe em suas páginas de rede social e o outro numa tarefa no computador não relacionada a essas mídias. A partir disso você mede as diferenças de narcisismo para ver se o grupo das redes sociais mostra níveis maiores. Os resultados dessa abordagem têm sido mistos e inconclusivos.

Outra abordagem é longitudinal, medindo o narcisismo e o uso das mídias sociais com o tempo e vendo se eles se fortalecem mutuamente; ou seja, se o narcisismo prevê o uso da mídia social e se isso, por outro lado, prevê o aumento do narcisismo. Pelo menos um estudo mostrou esse padrão.

Talvez também seja o caso da mídia social inflar o narcisismo daqueles já predispostos, mas não ter nenhum efeito nos outros.

Então é plausível que o uso das mídias sociais aumentem o narcisismo. Mas também há uma pesquisa longitudinal sugerindo que o uso das mídias sociais pode tornar as crianças mais empáticas. Por exemplo, crianças que passam tempo se engajando com amigos nas redes sociais talvez fiquem mais preocupados com os altos e baixos das vidas de seus amigos.

Deste modo, dado as excentricidades da ciência social e o desafio de descobrir a resposta da pergunta causal (sem designar aleatoriamente 300 crianças para evitar as redes sociais até fazerem 18 e ter seu narcisismo medido), acredito ser melhor esperar por mais dados.

Criadores de mídia sociais bem-sucedidos

Narcisistas são criadores de mídias sociais bem-sucedidos. Eles constroem pontes até outras pessoas e geram conteúdo. Talvez sejam irritantes de vez em quando e corram um pequeno risco de se tornarem viciados em internet, mas o papel que indivíduos narcisistas desempenham em construir redes nas mídias sociais talvez tenha ajudado a criar a mídia social massiva que temos hoje.

Seja lá o que isso resulte.


publicado em 08 de Janeiro de 2017, 00:05
Breno franca jpg

Breno França

Editor do PapodeHomem, é formado em jornalismo pela ECA-USP onde administrou a Jornalismo Júnior, organizou campeonatos da ECAtlética e presidiu o JUCA. Siga ele no Facebook e comente Brenão.


Puxe uma cadeira e comente, a casa é sua. Cultivamos diálogos não-violentos, significativos e bem humorados há mais de dez anos. Para saber como fazemos, leianossa política de comentários.

Sugestões de leitura