Crianças mais saudáveis nesta fase da pandemia: uma realidade possível?

Olhamos para os principais desafios da saúde física e mental das crianças e pedimos que pais e mães compartilhassem aprendizados da vida real para cultivar mais bem-estar para filhos e filhas na reabertura gradual.

A pandemia de Coronavírus colocou crianças, pais, mães, profissionais do ensino e todo o país em uma situação sem precedentes recentes. Com dores e perdas atravessamos o pior momento. Mas e daqui pra frente? Conseguiremos cultivar essa nova fase (na qual a pandemia ainda não acabou) com mais saúde para nós pais e para as crianças?

"O primeiro desafio que esse um ano de pandemia nos trouxe foi o de entender que somos humanos e que não vamos dar conta de tudo. [Precisamos] entender e acolher essa nossa impotência perante a tantas coisas que a gente tá vivendo. [...] Dos cuidados, em sua completude, que gostaríamos de dar, nos estudos, no cuidar da casa, no cuidar dos filhos".   - Diz Thiago Queiroz, também conhecido como Paizinho Vírgula!, no evento PAI: os desafios das paternidades atuais 2021.

Agora temos o avanço da vacinação, a volta às aulas, e também a variante Delta do Coronavírus reacendendo o medo e os cuidados em muitos pais e mães. 

Se não está fácil nem para os adultos, que conseguem ter mais controle das situações, imagine para as crianças que dependem do tempo, recursos e descanso dos pais para terem suas necessidades atendidas?

COMO ESTÃO OS PAIS?

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O estudo The Parenting Index, encomendado pela Nestlé, mediu o bem-estar dos pais e os desafios da parentalidade em 16 países, e identificou que o Brasil é o segundo país da lista onde é mais difícil criar crianças: 

"Os pais no Brasil enfrentam desafios relacionados com a elevada pressão, fraca resiliência financeira e falta de satisfação com os suportes para a vida profissional. Sentem ainda que não vivem num ambiente solidário."

  • Solidão em um mundo hiperconectado: 32% dos novos pais e mães dizem que, apesar da facilidade de conexão, com amigos e família, se sentirem isolados e solitários com um bebê nos braços. 

  • Culpa dos pais: 45% dos entrevistados concordaram que sentem muita culpa, o que impacta a relação com os filhos.

  • As realidades inesperadas da parentalidade: quase um terço (31%) relatou sentir-se despreparado para a realidade de ser pai ou mãe e 53% teve que fazer mais concessões do que o esperado. 

E AS CRIANÇAS? COMO SABER SE OS FILHOS ESTÃO BEM?

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Para entender o bem-estar da criança, devemos considerar 3 dimensões: saúde física, saúde mental e bem-estar social.

Na dimensão de saúde física:

Alguns dados são preocupantes. A pesquisa “Índice de Bem-Estar dos brasileirinhos” (feita pela Nestlé) aponta que aproximadamente 4 em cada 10 crianças estão sedentárias, ou seja, praticam menos de 30 minutos de atividade física por dia.

Para crianças mais saudáveis precisaríamos de ao menos uma hora por dia de atividade física intensa ou moderada.

[Se quiser dicas para tirar as crianças das telas e incentivar brincadeiras mais analógicas e ativas, veja nosso texto anterior]

O índice também revela que doces, sobremesas e bebidas adocicadas representam cerca de 20% da alimentação de crianças de 4 a 13 anos.

Na dimensão de saúde mental: 

Antes da pandemia, estimava-se que, no Brasil, aproximadamente 1 a 7 crianças e adolescentes — de 0 a 19 anos — tivessem transtornos mentais como depressão, ansiedade e outras questões. 

Segundo uma pesquisa conduzida na China, mais especificamente em Xianxim, a pandemia também desencadeou alguns efeitos psicológicos como: 36% das crianças apresentavam dependência excessiva dos pais; 32%, desatenção; 29%, preocupação; 21% problemas de sono; 18% falta de apetite; 14% pesadelos constantes.

Um estudo brasileiro recente, da Faculdade de Medicina da USP, avaliou a saúde mental de 7 mil crianças ao redor do Brasil a partir de junho de 2020, ou seja, imersos no contexto pandêmico. Segundo os dados apresentados pelo Professor Guilherme Polanczyk, 1 a cada 4 crianças apresentou ansiedade e depressão em níveis clínicos, precisando de intervenção especializada. Esse é um problema que não acaba simplesmente com a volta às aulas.

Na dimensão de bem-estar social: 

Esta varia muito com a idade da criança, para os mais novos (menores de 4 anos), esse bem-estar depende muito dos pais, quanto tempo de qualidade eles têm pra dedicar ao contato com os filhos. Para os mais velhos, os fatores desse bem-estar são mais diversos: mesmo que a interação com os pais dentro de casa esteja boa, faz falta o contato com os colegas.

Este é o caso do Felipe, pai da enteada Giovana, que conta:

“nosso convívio em casa sempre foi bom e a proximidade ficou até melhor. A Gi sempre foi mais na dela, então o distanciamento social não foi um grande problema. Complicado foi quando ela mudou para o técnico, porque mudou todo o esquema de aula, contatos com a escola, etc. Foram três meses para endireitar tudo. Tem também uma pequena ansiedade dela em pensar na volta, já que ela não conhece mais ninguém.”

Thiago que é publicitário e pai de uma filha conta como foi difícil para a pequena estudar sem os colegas:

“era exaustivo pra ela passar um período da tarde sentada. Perdia o foco, ficava entediada e se frustrava quando não conseguia resolver alguma atividade, algo que, em aula, seria contornado pela professora e colegas”

Thiago aconselha os pais a darem atenção e suporte às crianças, ferramentas para que elas consigam cultivar mais bem-estar. 

O aprendizado das crianças foi brutalmente impactado.

Legenda

Muitos pais notam que os filhos foram impactados quando olham para as questões de aprendizagem. O estresse, a falta de convívio social e de atividades mais interativas fora da aula online e das telas afetam o interesse, a capacidade de concentração e de memória. Isso é fato. 

No entanto, a preocupação exclusiva com a aprendizagem e desenvolvimento escolar pode gerar uma outra sobrecarga que recai sobre as crianças e que não as ajuda.

O psicólogo Leonardo Piamonte falou sobre isso também no evento PAI: os desafios das paternidades atuais: 

"A gente entende a infância como um processo de aparente normalidade em que a criança tem que cumprir uma série de expectativas: 4 anos tem que saber isso, aos 10 anos, aquilo. Muitas famílias estão preocupadas com a suposta regressão dos filhos, com atrasos na fala e atrasos no desenvolvimento. (...) De repente a gente está dando pouca importância para a carga emocional da pandemia.”

O pediatra Daniel Becker ressaltou as várias formas como a pandemia impactou a saúde das crianças:

“A gente precisa considerar as crianças como vítimas não fatais dessa pandemia. Se elas não adoeceram no começo [pelo coronavírus], elas foram adoecendo ao longo da pandemia, o que foi percebido rapidamente pelos pediatras. (...) Elas começaram com bruxismo, tics, gagueira, com regressões de desenvolvimento. 

A gente foi percebendo um mal estar psíquico enorme na infância que tem a ver com o convívio com pais sobrecarregados (...),  as tensões se acumulam com a perda de entes queridos, como o medo da perda e do adoecimento, com o excesso de telas (que foi brutal para infância), com comida ultraprocessada, perda da socialização e, principalmente, pela perda da escola.”

Saúde física, mental e social: os três pilares precisam atuar juntos.

Muitas vezes a gente olha para a vida em caixinhas separadas: escola em uma caixa, saúde física na outra, estresse e convívio social em outras). Mas a realidade não funciona assim.

O emocional se conecta diretamente à aprendizagem e saúde física. Os níveis de estresse são causados por um hormônio chamado cortisol. Altos níveis deste em uma criança (ou em adulto) podem prejudicar o sistema imunológico bem como prejudicar a memória e aprendizagem. 

Ao mesmo tempo, exercícios físicos ajudam a relaxar, regular o estresse e a liberar endorfina, o que também melhora a função cerebral.

Mas agora vai passar...

Com o retorno às aulas, a vacinação e a volta da sociabilidade das crianças, alguns dos fatores que tanto dificultaram para os pequenos vão passar. Mas lidar os efeitos dessa fase vão demorar mais tempo para serem mitigados, como bem nos contou a empreendedora Gisele, mãe de um casal:

“A maior frustração minha e dos meus filhos foi que criamos uma expectativa de que essa volta às aulas fosse um portal mágico para algo parecido com a vida que tivemos um dia no passado. Porém a adaptação foi caótica e tivemos que voltar vários passos atrás.”

Muitos apontam a pandemia como, sobretudo, uma crise de cuidado. E sem qualquer ingenuidade em tentar achar pontos positivos numa crise devastadora, devemos ao menos aprender com a nossa história: aprender que o cuidado é importante de maneira integral. 

Não é só sobre cuidar de si e dos seus, da porta para dentro, é coletivo e diz respeito a toda a sociedade. Não é só sobre a saúde física, é com a saúde emocional e com o bem-estar social. Gisele deixa um conselho: “Lembrem-se de serem generosos e acolhedores com as crianças, mas principalmente com a gente mesmo.”

Como ressalta o psicólogo Leonardo Piamonte, também é o momento dos homens, que por conta da pandemia, puderam estar mais implicados na dinâmica de cuidado da casa e da família, terem mais atenção para essa dinâmica e necessidades de todos.

Como é possível cultivar ambientes mais saudáveis para as crianças em meio e após o caos?

Sabemos que não existe fórmula mágica, mas também conhecemos os pilares de cuidado que precisamos atentar - saúde física, mental e bem estar social - e sabemos que um não funciona sem o outro.

Cultivando saúde física:

No "Índice de Bem-Estar dos Brasileirinhos" encontramos alguns pontos chave para o cultivo da saúde física:

  1. Incentivar as crianças a realizarem ao menos um hora de atividade física por dia para crianças. 

Luana, auxiliar de enfermagem e mãe de um casal, conta que começou a fazer atividades físicas junto com os filhos e isso foi importante para manter saúde mental de todos.

2. Melhorar a alimentação da família como um todo:

Para isso é preciso que os pais possam ter tempo e recurso para planejar e preparar refeições de maior qualidade. A participação dos homens que são pais nesse processo, ajuda a reduzir a sobrecarga das mães e pode fazer toda a diferença.

3. Comer ou preparar alimentos em família é também um incentivo para que as crianças deem valor a nutrição saudável e mais diversificada. 

Quando considerar essas necessidades individuais vira um desafio, uma sobrecarga, o cientista social e pai de um filho, Helton Souto dá uma dica que pode ser crucial nesse processo:

“Cada pessoa e família vive situações muito particulares. Talvez a questão seja buscar soluções conjuntas e que beneficiem todos na casa.”

Saúde emocional e bem-estar social: 

Foto por Natasha Hall no Unsplash

Quando conseguimos entender o quanto esse período tem sido desafiador para os pequenos, conseguimos acolher suas necessidades com mais carinho e atenção.

Não teremos todas as respostas na ponta da língua porque estamos vivendo problemas para os quais nenhum de nós fomos preparados. Diálogo, escuta e acolhimento são peças-chave nesse momento.

Mônica que é profissional da educação e mãe de uma filha também deixa um aprendizado que nos ajuda cultivar mais saúde em família:

“Tenham paciência consigo e automaticamente essa paciência irá refletir nos filhos. Não tem como exigir que todos os dias sejam excelentes e perfeitos. Saber lidar com momentos de pouco desempenho é importante também. Não pode desistir. É aplicar, diariamente, a organização que a família elaborou, mas sem se punir por não ter atingido os 100%. E não adianta o pai mandar o filho fazer se ele mesmo não faz. A criança imita o que você faz e não o que você fala.”

Podemos sim cultivar mais saúde para nós e para as nossas crianças, poderemos fazer isso através do equilíbrio, paciência, da compreensão e da construção de planos coletivos, que funcionem para o grupo de pessoas que vivam em um lar. 

Mecenas: Nestlé por crianças mais saudáveis

O Programa Nestlé por Crianças Mais Saudáveis é uma iniciativa global da Nestlé, que assumiu o compromisso de ajudar 50 milhões de crianças a serem mais saudáveis até 2030 no mundo todo. Desde 1999 foram beneficiadas mais de 3 milhões de crianças no Brasil. 

Com o lema “muda que elas mudam”, a partir de uma plataforma de conteúdo, o programa estimula famílias a adotarem hábitos mais saudáveis e ainda promove um prêmio nacional que ajuda a transformar a realidade de 10 escolas públicas por ano com reformas e mentorias pedagógicas. 

Conheça mais no site do programa.


publicado em 02 de Setembro de 2021, 10:40
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