O mito do hack do crescimento: por que precisamos desacelerar

Será que crescer o mais rápido possível é sempre a melhor opção?

Em 2000, Kwame Brown era um aluno de ensino médio na Glynn Academy na Georgia. No ano seguinte ele foi escolhido por Michael Jordan durante a primeira fase para o Washington Wizards.

Já ouviu falar nele? Provavelmente não. 

Depois de uma primeira temporada desapontadora (não sou muito ligado em esportes, mas até eu sei que fazer uma média de 4,5 pontos e 3,5 rebotes por jogo não é bem o suficiente para entrar na NBA) Kwame passou por vários times antes de ser dispensado pelo Philadelphia 76ers em 2013.

O que aconteceu? Kwame foi o primeiro jogador escolhido na primeira fase que foi diretamente do ensino médio para o meio da NBA. Embora isso tenha funcionado para LeBron James alguns anos mais tarde, Kwame claramente não estava pronto. E ele não é o único: o mundo dos esportes tem centenas de exemplos parecidos todos os anos.

“E daí? Não assisto esportes!” diz você. Muito bem, então deixemos as analogias de lado. O que estou querendo demonstrar é que muitas vezes pode haver um lado problemático com nossa obsessão de crescer rápido.

O crescimento (especialmente o crescimento rápido) é o estilo de vida nas startups. Na verdade, não é um estilo de vida, é a vida da startup. A mentalidade de cresça rápido/fracasse rápido está tão embutida em nossas mentes que esquecemos de assimilar o processo, o deixando de lado enquanto prestamos atenção nos resultados.

Mas devemos buscar o mesmo tipo de crescimento em nossas vidas pessoais?

Quando uma empresa fracassa, seguimos adiante e começamos algo novo, mas no que diz respeito a seu crescimento pessoal, há algo muito maior em jogo.

O tipo correto de crescimento

De cara precisamos lembrar uma coisa: o crescimento não é o inimigo. É a ideia moderna de aumentar o crescimento, de sempre tentar alcançar os resultados o mais rápido possível – de pular etapas e evitar os “pedágios” que nos disseram que temos que pagar (a quem, não sei bem ao certo).

Essa mentalidade o prende numa ideia de constante busca por aprovação. Suas realizações dizem mais respeito a uma validação de suas capacidades do que são vistas como resultado de seu trabalho duro.

A psicóloga de Stanford Carol Dweck passou as duas ultimas décadas pesquisando o poder de nossas crenças, tanto as conscientes quanto as inconscientes, e dividiu nossos traços básicos de personalidade em dois tipos de mentalidade: fixa e de crescimento.

Uma mentalidade fixa acredita que nosso caráter, inteligência e criatividade são estáticos – algo que não pode mudar (a atitude “nasci desse jeito”). Então em cada situação em que usamos essas coisas, estamos sempre buscando a aprovação dos outros. Queremos que as pessoas digam que o que temos está bom.

Por outro lado, aqueles com uma mentalidade de crescimento prosperam em meio a desafios, e não veem os fracassos como provas de sua incapacidade, mas como uma prancha de onde saltar para o crescimento. A vida se torna uma lição constante e sempre mutável, sem uma prova final.

No trabalho de Dweck ela amostrou 143 pesquisadores da criatividade que, sem grande surpresa, concordaram que o traço número um por trás do sucesso criativo é a resistência e perseverança daqueles com uma mentalidade de crescimento.

É irônico que tentar crescer rápido demais seja frequentemente o efeito colateral de buscar aprovação: de coaches, pais, investidores, e até dos amigos. Aqueles entre nós que buscam provar seu valor na verdade estão presos na mentalidade fixa, em vez de abraçar o crescimento duradouro.

No final das contas, o resumo de tudo é a escolha entre duas formas de viver: com paixão pelo aprendizado ou com uma ansiedade constante por aprovação.

Porque a presença é mais importante do que receber elogios

Faz sentido, portanto, levar as coisas mais devagar. Em vez se focar nos resultados e em quão rápido os podemos alcançar, podemos tomar nosso tempo e abraçar o presente, dispondo os hábitos e sistemas que criarão os processos em que queremos nos engajar pelo resto de nossas vidas.

O psicanalista e professor da University College London Stephen Grosz passou 25 anos examinando os efeitos dos elogios, e como podem de fato diminuir a confiança e nos fazer querer desistir em vez de continuar a crescer. A pesquisa de Grosz foca muito nas crenças, devido a percepção de que “ao longo da última década vários estudos sobre autoestima chegaram à conclusão que elogiar uma criança como ‘inteligente’ pode não a ajudar na escola. De fato, pode até mesmo fazer com que ela vá mal. Muitas vezes uma criança reage ao elogio com a desistência – porque desenhar outra vez se já fizemos ‘o melhor’?”

O mesmo pode ser dito sobre nós em nossa vida adulta. Com exceção de alguns eleitos, o louvor constante não nos leva a nos esforçar cada vez mais. Em vez disso somos bombardeados com mantras que nos dizem que o que importa são os resultados, depois dos quais podemos fazer o que quisermo – ditos tais como “empreendedores estão dispostos a trabalhar 80 horas por semana e evitar trabalhar 40 horas”, ou como “se você viver como ninguém, mais tarde você vai viver como ninguém”.

O que tudo isso faz é colocar toda a ênfase no resultado final, em vez de construir uma vida que ofereça espaço constante para autorreflexão e progresso.

O argumento para a diminuição da velocidade

Quando você leva as coisas mais devagar, e toma o tempo necessário para focar o processo e não apenas o resultado, você aprende a amar o que está fazendo, bem como o porquê de você o estar fazendo. A maior parte do crescimento é baseado em resultados, com nenhuma atenção sendo dada aos porquês. No meu próprio passado, eu me forcei da posição de escritor para a posição de editor em uma revista em alguns meses, sem nem mesmo saber bem o que seria meu trabalho como editor (se escreve bem menos, a não ser e-mails) só porque eu achava que importava mais ter um título do que ter a experiência.

Eu queria subir rápido. Queria hackear minha carreira. Não queria que as coisas acontecessem devagar. As queria agora – uma mentalidade comum em qualquer jovem criativo.

O homem que avança cuidadosamente passo a passo que vai atingir o maior sucesso.

Mas há um bom argumento para ir mais devagar e tomar seu tempo.

“A história que contava para mim mesmo era a de que o vazio e o vagaroso eram a mesma coisa. Eu não podia estar mais errado. Descobri recentemente que quando o tempo é bem usado, a pouca velocidade pode ser na verdade uma das fontes mais profundas de abundância..” – Matt Steel (Sócio e Diretor Criativo na Grain)

Há espaço no ir devagar para realmente afinar as habilidades e lapidar as ideias antes de se jogar no lado fundo da piscina.

O designer Peleg Top escreveu sobre criar um ‘espaço branco pessoal’ ao tirar folgas e espaçar a agenda. Começou simplesmente tirando todas as sextas-feiras de folga, e daí começou a separar sabáticos de um mês inteiro.

“[esse tempo de folga] me ajudou a ver as coisas de uma perspectiva maior e abriu mais espaço para me permitir CRIAR mais. Eu passava essas sextas-feiras focado no MEU crescimento, e, por sua vez, meu negócio cresceu no mesmo passo.”

Há um culto de ser ocupado em que facilmente nos pegamos – o pensamento falso de que ser ocupado significa ser produtivo. Quando você está trabalhando pelo bem do trabalho, você está fazendo as coisas do jeito difícil, não do jeito esperto.

Outra ótima forma de pensar no assunto é similar a ideia de “fazer menos” do que a competição que Jason Fried e David Heinemeier Hansson  da Basecamp falam em seu livro REWORK.

Em vez de se forçar a trabalhar cada vez mais tempo e com mais esforço, separe um tempo para ir devagar e compreender o processo. É isso que lhe dá o discernimento sobre o núcleo do que você deve fazer – as questões que você devia estar respondendo.

“Faça menos do que o competidor para os vencer. Resolva os problemas mais simples, e deixe os problemas cabeludos, difíceis e tinhosos para a competição. Em vez de superá-los, tente ficar para trás. Em vez de fazer mais, fazer menos.”

Ir devagar, fazer menos, tirar folga – nenhuma dessas coisas se alinha com o mito cultural do hack do crescimento, mas são exatamente as medidas que algumas das pessoas mais bem sucedidas tomaram para chegar onde estão agora.

Ser o primeiro não significa ser o melhor

Mas se ir mais devagar para seu próprio crescimento pessoal não é incentivo suficiente, que tal ir mais devagar pelo bem da empresa?

A Apple não é bem conhecida por fazer as coisas primeiro, mas em vez disso, por as fazer melhor. Eles usam bem seu tempo para aperfeiçoar um produto antes de o lançar.

O iPod não foi o primeiro tocador de MP3 portátil que existiu, mas foi o mais bem sucedido. Da mesma forma, o iPad não foi o primeiro tablet (nem mesmo da Apple), mas ainda assim ele ganhou o mercado porque a empresa usou bem o tempo para se assegurar de que tinha feito tudo que podia durante a fase de design.

Como o pioneiro em programação e interação com o usuário Alan Cooper colocou:

Não existe essa coisa de “vantagem de ser o primeiro”. Há, no entanto, a “vantagem de vencer primeiro”, e muitas vezes se confunde as duas.

O Pinterest é outro ótimo exemplo de uma companhia que tomou seu tempo para ir devagar e compreender seus processos sem se focar em usar cada oportunidade para alterar uma coisinha aqui ou ali para chegar no topo.

Andy Johns, que trabalhou no Facebook, Twitter, e no Quora recentemente falou do crescimento do Pinterest num post louvando o crescimento vagaroso da empresa:

“Quando você se foca no crescimento agressivo cedo demais, é mais fácil fracassar rápido, em particular quando o produto não está bem pronto. Você está basicamente adquirindo novos usuários numa taxa muito alta, mas com baixa taxa de retenção. Quando se faz o oposto e apresenta um bom produto em primeiro lugar, e então busca o crescimento agressivo depois da aceitação orgânica, isso torna o caminho para o sucesso mais rápido.”

Pense sobre sua própria vida e carreira: você quer ser o primeiro, ou quer ser o melhor?

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A maioria de nós não está pronto para a NBA, já que o máximo que jogou até agora foi um basquetinho de rua, mas a sedução das luzes do estádio (e os salários enormes) geralmente são suficientes para nos persuadir, e assim evitamos nosso juízo mais acertado.

Enquanto é verdade que para algumas pessoas a fama rápida pode ter longevidade, isso é a exceção, não a regra. Ser primeiro raramente significa ser o melhor, enquanto que separar um tempo para crescer vagarosamente e aproveitar bem o processo garante que você terá uma vida de crescimento contínuo.

“Quando você se foca na prática e não na performance, você pode aproveitar bem o momento presente e ir melhorando ao mesmo tempo.” -James Clear

Crédito das imagens: Dustin Scarpitti, Brainpickings.org, Grégoire Hervé-Bazin

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Nota: esse texto foi originalmente publicado no blog Pick Crew.


publicado em 21 de Março de 2015, 12:45
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Jory McKay

Editor no blog @PickCrew


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