"Se seus pais ou outros adultos em sua casa costumavam te xingar, insultar ou humilhar;
Se costumavam te empurrar, agarrar, estapear ou jogar coisas em você;
Se costumavam te bater tão forte que você ficava marcado e machucado;
Se você sentia que ninguém de sua família te amava, ou achava que você era importante ou especial;
Se sua família vivia em pobreza extrema;
Dê um passo para dentro do círculo."
É assim que Fritzi Horstman convida homens encarcerados numa prisão de segurança máxima da Califórnia a revisitarem suas histórias sob o lema de que não há vergonha.
Tendo sido abusada verbalmente e fisicamente por sua mãe e sexualmente por um homem ainda durante a infância e juventude, Fritzi não esconde que, no passado, dirigiu sob efeito de álcool, traficou drogas e foi uma delinquente juvenil.
Hoje, é com franqueza, coragem e vulnerabilidade que dá início a conversa com presos do sistema penitenciário dos Estados Unidos. Em roda, Fritzi abre um espaço seguro para que homens explorem seus passados, o que lhes aconteceu e o que fizeram e tudo o que os levou até ali.
"Quando você estuda populações encarceradas, vê a preponderância comum de traumas na infância e doenças mentais. Ambos andam juntos. Então, o que temos nas prisões são as pessoas mais traumatizadas de nossa sociedade."
— Dr. Gabor Mate
Começam sem falar, ouvindo o convite para que revisitem seus episódios traumáticos da infância e movimentem-se dentro de um grande círculo. É a oportunidade de olhar para o passado e ver outros homens fazendo o mesmo, sem serem constrangidos uns pelos outros.
Depois, em círculos menores, sentados, alguns destes mesmos homens vocalizam pelo que passaram e de que formas suas identidades foram moldadas pela sucessiva violência que receberam e praticaram.
Essas são atividades do projeto que fundou: Compassion Prison Project. Fritzi uniu-se a terapeutas, médicos, profissionais de diversas áreas e homens encarcerados interessados na causa para montar uma extensa rede de suporte que estuda trauma e treina voluntários que possam ser anfitriões de círculos por todo o país.
Por meio de práticas de compaixão, a fala e o toque são transformados em instrumentos de cura que criam entre homens encarcerados a atmosfera ideal para a reabilitação.
Ali, a violência e o sofrimento que lhes foi infligido e também que infligiram são correlacionados de modo que a falta de senso de estima, valores, empatia e compaixão sejam endereçados e completamente reformados.
Crenças autodestrutivas sobre masculinidade, poder e identidade são postas em cheque por seus próprios parceiros de grupo, que são responsáveis não só por si mesmo e por seus atos, mas também por lembrá-los uns aos outros da reabilitação a que se comprometeram.
A organização já filmou dois documentários sobre o projeto, que não poderiam ser melhores. Publicamos aqui o primeiro, que nos dá a dimensão da força da reabilitação.
Aqui, a segunda parte do documentário sobre o Compassion Prison Project. Ative as legendas pelo YouTube.
Quero saber mais:
- Se quiser conhecer outra iniciativa na mesma linha, dê uma olhada na Inside Circle;
- Confira a fala poderosa de Eldra Jackson, ex-presidiário reabilitado que, por meio do Inside Circle, foi convidado a reformular sua identidade e senso de masculinidade e hoje trabalha com a reabilitação de outros presos. Também é casado e tem dois filhos que, em suas palavras, recebem seu colo quando choram.
publicado em 07 de Setembro de 2020, 06:00