O que esperar de nossos filhos no futuro?

Como as próximas gerações irão lidar com o mundo que está caminhando, hoje, cheio de transformações?

Tom Wagg, de 15 anos, ficou fuçando nos complexos números de uma instituição de dados astrofísicos e espaciais e achou um novo planeta. Estava no colegial quando isso aconteceu. Jack Andraka, com 15 anos também, sacou uma forma de detectar o câncer pancreático 10 vezes mais sensível e 26 mil vezes (isso, 26 mil) mais barato que os métodos atuais. A ideia lhe ocorreu durante a aula de biologia. Um amazonense de 16 anos desenvolveu uma fórmula química nova para encontrar o número de oxidação de um metal eletrolisado. Uma garota de campos dos Goytacazes achou asteroides desconhecidos orbitando entre júpiter e marte. Ela não tem Internet na casa dela.

Mylena Peixoto, 16 anos, em sua visita à Nasa

Impressionante.

Mas, sem desmerecer e cá entre nós, nada novo na nossa história como espécie. Yo Yo Ma tocava o violoncelo como ninguém aos 4 anos, aos 11 Mozart já tinha 4 concertos para piano. A Judith Polgar foi declarada grã-mestre de xadrez... com 15 anos.

Fiquei sabendo desses casos depois de conversar com um pai, que me dizia que esse era seu sonho de consumo (sic): "ter um filho capaz de uma coisa dessas". A sua filha já segue esse caminho. Ele a ensinou a contar até dez em inglês, aos dois anos. faz a alegria da família nas festas e reuniões.

Fiquei pensando na obsessão desse nosso amigo com o futuro dos seus filhos. Ele (brasileiro) fala em inglês com a sua filha mais velha, pois acredita que isso vai abrir as portas pra ela. Sua filha mais velha, além de uma agenda complicada de atividades complementares, também está numa escola em que tem aulas de empreendedorismo e liderança para as crianças. “ela não vai passar perrengue”, ele diz.

Entendo que as intenções de todos os pais que se preocupam com o futuro dos filhos são nobres. Entendo também que o amor é genuíno e a preocupação sincera. Sei que nenhum pai quer ver seu filho passando perrengue e quer ele pleno e feliz.

Mas que futuro é esse? Ninguém sabe. Pense na sua vida faz dois anos. Faz cinco. Faz vinte. Quanto do que você faz hoje era um plano seu lá atrás? Diz a estatística que 60% das profissões de hoje não vão existir no futuro. 40% das empresas que hoje consideramos como grandes serão irrelevantes em 10 anos. 89% das empresas na Fortune 500 de hoje não existiam faz 4 anos. Dizem os acadêmicos que os avanços na tecnologia são apenas “imagináveis” para os próximos cinco anos.

Não fazemos ideia do que vai rolar daqui a seis.

Claro que todo futuro envolve uma aposta cujo resultado é uma incógnita. Mas... pra que apostar com tanta força então?

O futuro é a soma de um monte de presentes. Um após o outro. O futuro não ocorre. Ele se desenvolve, se constrói. Com os filhos não é muito diferente.

Alguns pais desenvolvem uma hipermetropia parental, em que não conseguem enxergar o que está perto, apenas vislumbram, com dificuldade até, o que está longe. Não conseguem relacionar a menininha brincando com independência com a adulta autônoma. Não relacionam que uma criança que aprende a se virar sozinha em tarefas básicas sem intervenções desnecessárias dos adultos é uma pessoa com mais chances de ser independente emocionalmente e mais capaz de lidar com a frustração. Quando uma criança aprende a ler a emoção do outro, a identificar as suas próprias emoções hoje, aprende a desenvolver relações sadias no futuro.

Essas coisas podem ser aprendidas hoje. Em casa. Com você.

Uma criança, especialmente a pequena, não precisa de grandes treinamentos, precisa de grandes lições.

O futuro que nos preocupa é um futuro possuído pela tecnologia. Esses pequenos são nativos digitais, não vão apanhar do Excel como você (até porque o Excel provavelmente nem vai existir mais). Usarão a tecnologia para tudo. Comprarão seus mantimentos usando a geladeira, que provavelmente automaticamente gerará uma lista do que falta e algum centro de distribuição voador enviará o pedido com um drone, ou uma maritaca robótica, vai saber. O futuro será multicultural, multilinguístico, colaborativo. Isso se a gente não se matar antes numa guerra nuclear.

O desafio não está em as crianças terem as habilidades, o conhecimento, as ferramentas e os secretos. Vai ter aplicativo pra isso tudo. O grande desafio é eles terem a ética, a solidariedade, o comportamento moral e a empatia necessária para uma verdadeira (r)evolução no meio de tanta inversão de valores... isso eles não vão achar na nuvem.

Essa próxima geração tem desafios enormes. Nenhum deles relacionado à tecnologia ou às habilidades necessárias para um mundo de trabalho que nem conseguimos imaginar como será.

Os desafios deles são humanos.

Estamos preparando filhos para vencerem. Para conquistarem. Para concorrer e vencer nessa guerra que é a vida (mais uma frase do meu brother). Mas e quando eles perderem? Quando não atingirem? Quando encontrarem um obstáculo enorme que simplesmente é maior do que eles nesse momento... o que eles vão fazer com esse conjunto todo de habilidades? De conhecimentos? Como vão lidar com a derrota? Com a perda? Com a solidão?

Os nossos filhos não precisam ser treinados para serem mais espertos. Precisam ser educados para serem mais equilibrados. A inteligência lá na frente será artificial... Será que os valores também?

Mecenas: Natura

Natura Homem acredita que ser pai é querer cuidar e, também, deixar as crianças desenvolverem o lado humano, fundamental para o futuro melhor que vislumbramos. Uma paternidade lúcida, sem modelos a serem seguidos, sem colocar ainda mais pressão sobre os nossos ombros.

As nossas verdades, os nossos ritmos, os nossos jeitos de ser e estar no mundo. Seja homem? Seja você. Por inteiro. Natura Homem celebra todas as maneiras de ser homem.


publicado em 30 de Agosto de 2017, 00:00
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Leonardo Piamonte

É psicólogo formado na Universidad Konrad Lorenz, de Bogotá, na Colômbia. Depois de trabalhar em clínicas psiquiátricas, centros de detenção e consultórios psicológicos, mudou-se para o Brasil há 12 anos, onde trabalha como psicólogo focado essencialmente nas questões relacionadas à paternidade, futuros pais e relações familiares.  


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