Carta ao meu neto: eu vi o Corinthians ser campeão mundial no Japão | Na Estrada #8

Querido netinho,

O ano era 2012. Você pode não acreditar, mas nunca tínhamos ganhado uma Copa Libertadores. E naquele ano, ganhamos pela primeira vez. Sofríamos na pele todo tipo possível de gozação. Era foda, mas era divertido.

Em dezembro, o Corinthians iria jogar no Japão o Mundial de Clubes da FIFA. Existia uma lenda muito forte que dizia que o mundo acabaria no dia 21 daquele mês. Por via das dúvidas, eu não poderia deixar de ver aquele que poderia ser o último jogo do Timão. Já não tinha conseguido ingresso pra final da Libertadores, então prometi a mim mesmo que estaria no Mundial. Passagens compradas, viagem planejada, embarquei com um amigo para a mais importante viagem da minha vida. Com apenas um objetivo: conquistar o mundo.

Umas trinta horas depois, estávamos lá. O Japão era muito diferente do Brasil. Exceto por um detalhe: estava infestado de brasileiros. Ou melhor, corintianos. "Vai Curíntia!" era o código universal, o nosso Konichiwa. Os japoneses não entendiam nada, mas tiravam fotos e gravavam qualquer poropopó que puxávamos no metrô.

Começando pela estação de trem de Nagoya

Conheci um país lindo, organizado, eficiente. Visitei muitos e muitos templos, um mais imponente que o outro. Vi de longe o majestoso Monte Fuji. Andei de trem-bala. Quer dizer, voei sem sair do chão naquela máquina incrível. Andei por várias linhas de metrô, comi muitos tipos de sushi, testei todos os botões da privada. Tirei foto com o Hachiko, Pikachu, Ultraman. Sei que você não conhece nenhum desses personagens, mas pro vovô foi emocionante.

O Japão é lindo, mas o mais bonito da viagem toda foi mesmo a invasão. A festa naquele frio de Toyota foi só uma prévia. Vencemos a semi-final, que foi bem mais sofrida do que deveria ser. E, quando voltamos ao hotel, um dos acontecimentos mais surreais que já vivi: um japonês bêbado pagou várias rodadas de cerveja pra todo corintiano que chegava. E nenhum de nós sabia qualquer palavra em japonês. Mas isso não impediu o cara de ficar "conversando" com a gente por umas duas horas. Tem coisas que só acontecem mesmo no Japão.

Fomos de Nagoya para Kyoto, encerrando a parte turística. E de lá voltamos para Tóquio, já na expectativa da grande final. Contra o milionário e favorito Chelsea. Domingo, um último trem para Yokohama. Mas podia ser Itaquera. Corintianos chegavam de todos os cantos. Era Carnaval na frente do estádio. Um Pacaembu de loucos estava ali. Pulávamos e cantávamos e rezávamos. Não seria fácil, nunca é. Mas todos ali sabiam que tinham que gritar o mais alto possível: éramos “apenas” 30 mil, representando os 30 milhões da nação. O time dependia da gente. Não podíamos decepcionar.

Castelo de Nagoya

Templo Dourado em Kyoto

A bola rolou e o resto da história você já ouviu mil vezes. Torcemos, sofremos, vencemos. Chorei de alegria, de emoção. Não apenas por torcer pro time campeão do mundo. Mas porque eu sabia, e todos ali sabiam, que tínhamos sido decisivos naquela vitória. Cada um daqueles loucos mereciam uma medalha. Os antis jamais vão entender, mas aquela era mais uma prova de que somos uma torcida que tem um time. O time do povo. O povo no topo do mundo.

Essa é a minha história. Foi falando despretensiosamente sobre ela que eu conheci sua avó. E depois seu pai nasceu, e ouviu milhares de vezes essa mesma história. E quando ficamos sabendo que você iria nascer, no dia 16 de dezembro, era certeza: só poderia se chamar Cássio Guerrero Rocha.

Então, meu querido Cassinho, essa é também a história de como você nasceu, daquela vez em que eu atravessei o mundo para conquistá-lo.

E descobri que um sonho só é impossível se você não for louco o bastante para realizá-lo.

Em frente ao Estádio Internacional de Yokohama, antes do jogo

E assim foi como ficou a torcida em Yokohama, após o jogo

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Vamos sentir a qualidade e quantidade dos relatos para decidir a frequência da série. Relatos fracos serão negados, já avisamos pra ninguém ficar tristonho. Além do que, mais importante do que ter a história publicada na web é ter vivido tudo na pele.

Até breve!


publicado em 10 de Janeiro de 2013, 06:46
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Rafael Ribeiro Rocha

Aprendeu a ler com a Turma da Mônica e nem se importa mais quando perguntam "biblio...o quê" ou fazem piadas sobre espanar poeira. Acredita que a educação pode mudar o mundo, mas não sabe se o mundo quer ser mudado. Corinthiano, alfabetizado e leitor, nasceu em Lagoinha-SP e mora na Cidade Maravilhosa.


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