É tudo uma questão de ponto de vista

Você está vivendo a sua vida, normalmente, quando resolve entrar em um banco. Para fazer uma abertura de conta, sei lá. Não importa. Junto com você, entre seguranças, clientes nas filas e funcionários nas mesas e guichês, há mais umas 50 pessoas no banco. Entra um assaltante. No meio da gritaria e do tumulto, um tiro é disparado e te acerta no braço.

Agora: se essa situação tivesse acontecido realmente e você fosse contar a história para algum amigo ou familiar, você diria que deu sorte ou azar?

Essa resposta é importantíssima, e de certa forma é indicativa da sua probabilidade de se dar bem na vida.

Não precisa necessariamente ser um banco

A e B

Há duas maneiras perfeitamente válidas e igualmente verdadeiras de relatar esse incidente.

A: "Puta azar, cara. Eu poderia ter ido pra qualquer banco, mas não! Tive que ir justamente no que seria assaltado. Passei medo, quase morri, voltei pra casa de ambulância. Tomei um tiro, cara. Um tiro! Podia ter morrido sem essa."

B: "Eu tava no banco hoje bem na hora de um assalto. Por sorte, só tomei um tiro no braço. Uma tala por uns dias e vou estar como novo. Imagina o que podia ter acontecido! Eu podia ter morrido. Várias pessoas podiam ter morrido. Felizmente foi só um susto."

Aprenda que você pode escolher o melhor contrafato

Nós, humanos, somos seres explicadores. Nós realmente precisamos encontrar explicação para tudo. Tudo precisa ter uma história. Os fatos não podem ser fatos isolados ("aconteceu um assalto no banco onde eu estava", só isso), senão nós não conseguimos lidar com eles. Quase tudo precisa ter um por quê, um motivo, uma história.

Como muitas coisas não têm, a gente inventa. E a melhor forma de entender o que aconteceu é contrastar com algo que poderia ter acontecido. Esta versão fictícia dos acontecimentos apenas para efeito de comparação e entendimento é o que eu estou chamando de contrafato.

No exemplo acima, como eu disse, os dois contrafatos são perfeitamente válidos. Só que, além disso, ambos são completamente fictícios. Inventados e construídas por nós ao contar a história. Isso significa que temos total liberdade para escolher contar de um jeito ou de outro. Cada uma das 50 pessoas do banco vai pra casa e escolhe qual história contar.

Se você escolhe algo parecido com a opção A (de Azar), começa a se descrever como azarado. Começa a falar, pensar ou acreditar, em alguma medida, que você "só se fode". E aí, meu amigo, a coisa da profecia autorrealizada entra em ação para, de fato, te foder.

Pode parecer autoajuda barata, mas o fato é que nós podemos conscientemente escolher contrafatos que expliquem os acontecimentos da vida a partir de uma perspectiva de "sorte". De que as coisas poderiam ser piores, e às vezes até são, mas isso que aconteceu? Ah, isso foi só um contratempo.

Do contrário, explicamos (a nós mesmos) os acontecimentos de forma que o mundo pareça muito mais opressor do que é. Nos sentimos com medo, impotentes. Começamos a achar que não tem jeito, o mundo é assim mesmo. Escolhemos pintar o mundo nessas cores.

Mas é uma escolha.

PS.: Existe todo um ramo da psicologia, chamado de psicologia positiva, que se dedica a estudar os casos em que as pessoas fazem esse tipo de coisa naturalmente. Elas são, de modo geral, mais felizes -- e por consequência disso, mais bem-sucedidas. Ando fascinado pelo tema. Se você também se interessou, indico o livro The Happiness Advantage (lançado no Brasil com o horrível título "O jeito Harvard de ser feliz"). Este texto foi completamente inspirado por um dos capítulos dele.


publicado em 01 de Novembro de 2012, 14:08
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Fabio Bracht

Toca guitarra e bateria, respira música, já mochilou pela Europa, conhece todos os memes, idolatra Jack White. Segue sendo um aprendiz de cara legal.\r\n\r\n[Facebook | Twitter]


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