Onde encontrar grupos reflexivos para homens autores de violência no Brasil?

Mapeamento completo é divulgado listando os espaços de de responsabilização e recuperações para homens que agrediram mulheres. Esta pesquisa é a atualização do mapeamento divulgado em 2020.

O Mapeamento de Grupos reflexivos e responsabilizantes para homens autores de violência contra mulheres no Brasil é uma iniciativa do Profº Drº0 Adriano Beiras, Daniel Fauth Washington, Michelle de Souza Gomes Hugill, UFSC, Poder Judiciario Brasileiro, junto com o Conselho Nacional de Justica e o COCEVID. A pesquisa reúne 312 iniciativas (que já haviam sido divulgadas em 2020) e divulgando agora análises sobre o funcionamento destes grupos e recomendações para que este tipo de iniciativa seja ainda mais eficiente no enfrentamento às violências contra meninas e mulheres.

O mapeamento foi feito em parceira com o Conselho Nacional de Justiça, o Colégio de Coordenadores  Estaduais da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário Brasileiro, o Poder Judiciário de Santa Catarina e a Universidade Federal de Santa Catarina, por meio do grupo de pesquisa Margens e NPPJ). Os autores são Adriano Beiras, Daniel Fauth Washington Martins, Salete Silva Sommariva e Michelle de Souza Gomes Hugill.

A principal motivação da pesquisa é a ausência de estudos em ampla escala da realidade dos grupos para homens autores de violência doméstica e familiar contra meninas e mulheres em território nacional e a ausência de diretrizes e recomendações.

A alta procura desses grupos demandava não só a listagem mas também os critérios e recomendações para a formação, constituição e controle de qualidade de um grupo reflexivo, instruções baseadas na realidade nacional e embasadas a partir de pesquisas nacionais e internacionais e na literatura do campo dos estudos de gênero, masculinidade e feminismo.

Sabemos que uma das características da violência doméstica é a reincidência e o escalonamento (as agressões tendem a voltar a acontecer e a se tornarem cada vez mais graves). Os grupos são importantes para interromper este ciclo evitando reincidências. O estudo, portanto, nos ajuda a localizar estes espaços focados em reduzir as violências contra as mulheres.

 

Grupo reflexivo para autores de violência.

Clique aqui para acessar o mapeamento completo:

"Grupos reflexivos e responsabilizantes para homens autores de violência contra mulheres no Brasil: Mapeamento, análise e recomendações".

Onde e como costumam funcionar estes grupos?

O mapeamento traz informações importantes: de todos os estados da federação, apenas Tocantins não apresenta nenhum grupo reflexivo para autores de violência, enquanto os outros estados apresentam pelo menos um. Estes números ainda não são suficientes se comparados com o número de casos de violência contra meninas e mulheres.

O estado com mais grupos é o Paraná, com 50 listados, seguido pelo Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Minas Gerais, o que indica uma predominância de grupos na região Sul/sudeste.

Dos 312 grupos, 79% das iniciativas tem ligação com o Poder Judiciário, e essa é uma especificidade do contexto brasileiro, onde as políticas voltadas à proteção à mulher são coordenadas em grande parte pelo Sistema de Justiça. No entanto, boa parte destes programas conectados ao judiciário são iniciativas individuais, de magistrados e funcionários.

Pode parecer óbvio que os grupos esteja concentrados no Judiciário, devido ao contexto criminal, mas na verdade a abordagem da Lei Maria da Penha é multidisciplinar e interinstitucional, considerando que pode ser positivo ter outras instituições e pessoas qualificadas para organizar grupos reflexivos sobre violência relacional, atendendo também a casos que não chegaram ao Judiciário.

Há dois motivos essenciais para que os grupos não estejam apenas no Judiciário: o primeiro motivo é a importância de incentivar a criação dos grupos para além do guarda chuva institucional, pois isso fortalece a iniciativa, as leis e o progresso social e também porque hoje os grupos são criados sem uma estrutura estabelecida, geralmente parte de uma vontade de uma pessoa de dentro ou de fora do sistema Judiciário, e por não ter um conjunto de regras, sobrecarrega as trabalhadoras e trabalhadores do judiciário e prejudica a sobrevivência dos grupos fora desse contexto. 53,8% dos grupos são criados a partir da iniciativa do/da magistrada.

Dentro ou fora do sistema judiciário, é importante que os grupos reflexivos no enfrentamento das violências contra meninas e mulheres sejam institucionalizados como políticas públicas para garantir programas contínuos, uniformes, disponíveis a todos, mais capilarizados e que atendam à sociedade como um todo.

Gênero, masculinidades e dinâmicas de poder: o que está em discussão nestes grupos?

Outro ponto de importância desse mapeamento é entender quais as bases de conhecimento aplicadas pelos grupos. A pesquisa aponta que falar sobre masculinidades, questões de gênero, feminismo e dinâmicas de poder, faz com que as reflexões do grupo resultem numa mudança mais eficaz. 

Os números apontam que 2/3 dos grupos utilizam estudos de gênero, 2/3 utilizam estudos de direitos humanos e um pouco mais da metade usam estudos sobre masculinidades. Estes números demonstram que uma parte muito significativa dos grupos não contam com embasamento técnico e formação tecnica especifica das equipes sobre questões de gênero, comportamento e violência  relacional.

Na pesquisa, a investigação desses grupos revelou que, na verdade, ainda há muito senso comum sendo reproduzido, o que prejudica a efetividade de do processo reflexivo e responsabilizantes destes grupos, por isso a importância de ter um mapeamento completo que define que um grupo deva ser guiado por estudos de gênero, masculinidades, feminismo, direitos humanos e outros temas.

O mapeamento de GHAV (grupos de homens autores de violência) e todo seu aporte sobre a constituição do grupo e estudos sobre gênero demonstram um avanço no campo acadêmico na pesquisa desse tema, principalmente direcionado aos homens. E em resultado à criação de novas leis e normativas se torna imprescindível um documento nacional que aborde esse tema, contribuindo assim para a constituição desamarração entre masculinidades e violências e o enfrentamento da violência contra a mulher.

Mas e na prática, como as iniciativas funcionam?

Nesse vídeo feito pelo Mov Uol, a equipe filma a realidade de um grupo reflexivo para homens autores de violência:

 

Supondo que um homem se vê reagindo com atitudes violentas, mesmo sem estar respondendo a nenhuma denúncia, ele pode procurar um grupo voluntariamente?

"Ele pode procurar voluntariamente. Na realidade os grupos não são feitos só no judiciário, ele são feitos em CREAS (Centros de Referência de Assistência Social), a partir de centros comunitários em alguns estados, a partir do Ministério Público, Polícia Civil ou em ONGs. Em alguns destes locais é possível você procurar e participar destes grupos." Diz Adriano Beiras.

Se uma pessoa identifica que tende a usar a violência para resolver conflitos, procurar um grupo voluntariamente é uma atitude necessária para passar por um processo de mudança, quebrando o paradigma de que quem está ali é um monstro. É uma pessoa que passa a refletir sobre suas ações, se responsabiliza pelas consequencias das suas ações e busca transformá-las.

Clique aqui para acessar o mapeamento completo:

Clique na foto abaixo para acessar o mapeamento completo de grupos pelo Brasil.

 


publicado em 01 de Dezembro de 2021, 18:43
Joao marques jpg

João Marques

Escritor, pesquisador da psicologia das masculinidades e questões raciais.


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