Grêmio de Luxemburgo, Palmeiras de Felipão e a Libertadores 1995

Dois mil e doze tem sido um ano confuso no Largo dos Campeões, em Porto Alegre (RS). É lá que o Estádio Olímpico se despede aos poucos. O torcedor sente isso. Uma sensação que vai desde a saudade prévia até a dolorosa despedida parcelada faz dessa temporada uma das mais confusas de todos os tempos.

Não somente pelo último ano assistindo jogos na Azenha. Mas também por quem comanda o time na beira do campo: Vanderlei Luxemburgo.

Não existiu treinador mais abominado pelos gremistas que viveram os anos 90 como Vanderlei Luxemburgo.

Contra o Palmeiras de Luxemburgo o Grêmio de Felipão proporcionou alguns dos duelos mais sangrentos e reais do futebol brasileiro. Eram jogos de Taça Libertadores em Copa do Brasil e Campeonato Brasileiro. Era a essência do futebol traduzida em peleias que fixaram ao Grêmio a imagem de time retranqueiro, catimbeiro e aguerrido.

Eram bons tempos. Tão bons que desejou o destino que se repetissem. De novo pela Copa do Brasil. De novo com cara de Taça Libertadores. Mas, somente de sacanagem, com os treinadores em lados opostos.

Somente por pura, torturante e clara sacanagem.

Não quero nem imaginar como será.

Mas vou.

I'm at Estádio Olímpico Monumental (Porto Alegre, RS) w/ 50k others

Quando Felipão saiu do vestiário de visitante e cruzou o gramado impecável do Estádio Olímpico, viu-se a história. O treinador, de boné e cabeça baixa, foi efusivamente aplaudido por 50 mil gremistas. Agradeceu com um breve aceno. Bastava para o torcedor. Afinal, ele sabia que aquele senhor representava um pedaço dos 109 anos do Grêmio atravessando o campo do Olímpico pela última vez.

O jogo já havia começado bem antes das 21h50 desse dia 13. O Palmeiras fez muita pressão para o árbitro não ser carioca. O Grêmio, por sua vez, apelou para o passado questionando a influência da Parmalat no futebol brasileiro dos anos 90. “O Jardel não estava impedido em 1997”, repetia o diretor de futebol do clube, Paulo Pelaipe. A decisão da CBF foi um árbitro argentino para o jogo. Um que deixasse o jogo correr.

Aparentemente, uma má ideia para os puritanos. Mas os jogadores não questionaram. E foram para o jogo.

Com Kleber recuperado e Moreno de volta da Seleção Boliviana, o Grêmio escalou o que tinha de melhor no ataque. E o resultado veio antes da primeira metade de jogo. Aos 17 minutos Fernando bateu falta rápida para Kleber. O atacante foi até o fundo e cruzou na cabeça de Moreno. Um a zero. “Novo Jardel, novo Jardel”, dizia Pedro Ernesto Denardin, nada cético.

Esse primeiro gol deixou o Palmeiras atordoado. Léo Gago acertou um tirambaço de fora da área e ampliou aos 23. E aos 28, após belo lançamento de Souza, Kleber entrou sozinho e tirou do goleiro com facilidade. Três a zero no primeiro tempo. A torcida em êxtase. Os jogadores do Palmeiras zonzos. A única saída alviverde foi apelar para marcação, não tomar mais gols e voltar vivo para São Paulo. Foi aí que Márcio Araujo chegou atrasado e acertou o joelho de Léo Gago. O tempo fechou. Jogadores se empurravam, cuspiam e agrediam. O árbitro resolveu o caso expulsando os dois jogadores.

Márcio Araújo saiu pelo lado dos bancos. Enquanto Léo Gago, ainda sem compreender a expulsão, saiu pelo lado oposto. Eles teriam que se cruzar para rumarem o caminho ao vestiário. Naquele momento a bola deixou de ser o centro das atenções do estádio. Todos previam que o pior podia acontecer. E aconteceu. Léo Gago deferiu uma voadora no peito de Marcio Araújo, que prontamente revidou com um soco. O jogo foi interrompido e o árbitro, temendo, encerrou o primeiro tempo.

Léo Gago e Márcio Araújo não voltaram para o segundo tempo

O Palmeiras ameaçou não voltar para o segundo tempo.

Porém, Felipão ouviu garantias do presidente do Grêmio, Paulo Odone, que a segurança seria feita em torno do campo. A invasão de torcedores estava descartada, apenas de alguns ameaçaram pular o fosso com destino ao campo.

O Palmeiras voltou com o talismã Maikon Leite no lugar de Luan. Já Luxemburgo providenciou a entrada de Rondinelly para dar a movimentação que Marco Antonio não conseguiu na primeira etapa. Logo na primeira participação efetiva no ataque, aos oito minutos, Rondinelly deixou Cicinho no chão e cruzou na cabeça de Marcelo Moreno. Mais um dele. E mais um de cabeça.

“To falando que é o novo Jardel, caralho”, disse Denardim, pouco se fudendo para a censura.

O resultado de quatro a zero no Palmeiras na fria noite de Porto Alegre fez o torcedor viajar no tempo. Se já era incrível ir ao estádio enfrentar um Palmeiras treinado pelo maior técnico da história do Grêmio e depender do mais odiado de décadas passadas, tudo pareceu mais absurdo ainda com aquele resultado. Fato comprovado com o gol de Fernando, de falta, já aos 40 minutos. Ficou assim o jogo: cinco a zero. Igual 1995. Uma surra. Um laço no Palmeiras.

O torcedor deixou o Olímpico com aquela sensação estranha de felicidade e a tradicional despedida a cada quarta, quinta, sábado ou domingo. O estádio que pregou a peça de ver Felipão apanhar de nós, agora, dormia ecoando os cânticos eufóricos da Geral.

Foi assim que terminou a noite do primeiro jogo entre o Grêmio de Luxemburgo e o Palmeiras de Felipão. O Grêmio está com um pé na final da Copa do Brasil. Afinal, ninguém acredita que o Grêmio vá tomar cinco gols no joga da volta.

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publicado em 06 de Junho de 2012, 13:20
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Fred Fagundes

Fred Fagundes é gremista, gaúcho e bagual reprodutor. Já foi office boy, operador de CPD e diagramador de jornal. Considera futebol cultura. É maragato, jornalista e dono das melhores vagas em estacionamentos. Autor do "Top10Basf". Twitter: @fagundes.


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