O que nossas mochilas e mesas de trabalho contam sobre nós?

Reuni dezenas de fotos das mochilas e das mesas de trabalho das pessoas e aprendi a aprender com os detalhes

Quando criei o Manual do Usuário, disse a mim mesmo e aos leitores que se tratava de um site de conteúdo sobre tecnologia. Olhando em retrospecto, parece-me, hoje, uma descrição equivocada. Sendo mais preciso, ele é um site que discute comportamentos e os impactos sociais desencadeados pela tecnologia. Isso vale muito para o macro (como apps como o Uber mudam a dinâmica das cidades?), mas também para o micro, para o individual (como as redes sociais se relacionam com a solidão?). Frequentemente, ao deparar-me com uma pauta, a pergunta que me faço é: como isso ajudará ou fará o leitor refletir?

Questionar é, em alguma medida, rever as pequenas decisões do dia a dia. Muitas delas tomadas já no piloto automático. O resultado desse processo pode ser chamado de dicas de produtividade, lifehacks, qualquer coisa; o que importa é ter a noção de que pequenas práticas revistas podem ter um impacto significativo em nossas vidas. Como é difícil sair desse modo automatizado, abordagens diferentes do “faça isso para conseguir aquilo" costumam ser mais eficientes. O exemplo é uma delas. Se alguém faz algo que parece bom, eu deveria ao menos considerar, certo?

Essa é a pegada de duas das seções mais queridas do Manual, a das mochilas e das mesas de trabalho dos leitores.

O que tem na sua mochila?

Na seção das mochilas, alguém abre a sua (pode ser também uma bolsa, pasta, qualquer objeto que sirva para carregar outros objetos) e conta o que costuma levar nela. Alguns itens são presenças recorrentes (notebooks, carregadores, fones de ouvido, óculos de Sol), mas vez ou outra surgem coisas inusitadas ou nem tanto, mas que fazem total sentido para certos perfis. Quem passa o dia fora, por exemplo, deveria considerar um kit de escova e creme dental como o que a Dani Arrais tem. Já para quem se locomove de bicicleta pela cidade, ter uma camiseta reserva num cantinho da mochila, a exemplo do Marco Gomes, é uma ótima pedida.

Se você for investir nessa, sugiro toalhinha e desodorante também.

A graça da seção e o que a separa do mero voyeurismo é esse fator utilitário, prático. O benefício para quem lê me parece bastante óbvio. Já para quem se abre, não é bem assim. Expôr-se ali, ainda que a audiência do site não seja enorme, é uma pequena auto-violação da privacidade. Ela alcança o equilíbrio por ser o compartilhamento de boas práticas, um ensino ou troca de experiências dada pelo exemplo. “Compartilhar”, num sentido mais nobre, é sair de uma zona de segurança, é se expôr. Por isso, mais do que pelo trabalho que dá organizar os objetos, fazer a foto e descrevê-los, sou muito grato a todos que já abriram suas mochilas para o Manual do Usuário; vejo tal ato como um de grande generosidade para com os demais leitores.

Esse aspecto é o mais importante, mas é impossível passar pelas mochilas sem pensar nos donos delas. Pelo conteúdo, estilo da foto e quantidade de itens se tem um vislumbre daquela pessoa. Identifico-me muito com os minimalistas, adeptos de ambientes claros e que têm o cuidado de organizar os objetos em ângulos retos — algo próximo do “knolling”, a prática de organizar objetos paralelamente ou em ângulos de 90o. Nesses termos, umas das minhas mochilas favoritas das que passaram pelo site é a da Monique Corrêa. A do Paulo Higa e a do Guilherme Valadares, aqui do PdH, também compartilham essas características.

Sim, o computador pelo qual o Guilherme fala com você tem essa marca de cola de adesivo mal tirado.

Em paralelo, mochilas que são o oposto disso chamam a minha atenção por motivos diversos. A do Matt Mullenweg, CEO da Automattic e um dos criadores do WordPress, detém o recorde de mais abarrotada de todas — são 52 (!) itens. Não me imagino carregando tanta coisa, mas fiquei fascinado em saber que isso é possível. A mochila do Philipe Martins é outro belo exemplo de mochila que não teria para mim, mas que impressiona pelo estilo.

Até o final do ano passado, a seção das mochilas era baseada em convites. Pedia a amigos, conhecidos e profissionais que admiro para, se tivessem disponibilidade, mandarem suas mochilas. Neste ano atendi uma antiga reivindicação dos leitores e abri a seção para todos. Agora, estendo o convite a você, leitor do PapodeHomem: caso queira compartilhar a sua, basta mandar um e-mail para ghedin@manualdousuario.net com o assunto “Mochila" e o seguinte conteúdo:

• Uma foto de todos os objetos (incluindo a bolsa/mochila) na proporção 16:9 e resolução mínima de 1440×810 (quanto maior, melhor), tirada com a melhor câmera que você tiver à disposição. (Não precisa colocar os números; eu mesmo farei isso aqui para manter o padrão.);

• Descrição detalhada, incluindo marca e modelo, de todos os objetos da foto;

• Uma foto sua, na proporção 1:1, com no mínimo 500×500 pixels;

• Uma mini-biografia sua, com entre 200 e 500 caracteres, escrita em terceira pessoa.

Como é sua mesa de trabalho?

Derivada das mochilas, outra seção surgiu no Manual: a das mesas de trabalho.

Calhou de, até o momento, a maioria das mesas ser de home office. Quando concebi a seção, a ideia era verificar junto aos leitores como é o espaço que, em muitos casos, é o único personalizável na empresa. Queria saber de que forma aquele reduto pessoal mínimo dentro de uma organização com regras e limites era decorado.

Enfim, não importa muito onde a mesa está. Mesmo em casa, a maneira como se organiza o espaço para trabalhar também diz bastante sobre quem está nele, talvez mais do que a mochila já que, no caso da mesa, trata-se de um esforço contínuo a fim de mantê-la funcional enquanto se trabalha e de otimizá-la para que o desempenho das funções seja o melhor possível.

A minha mesa, por exemplo, é livre de tudo, tem apenas o notebook e o smartphone ao lado. Alguns itens de uso não tão recorrente como headset (para gravar podcasts) e pen drives ficam numa gaveta, longe dos olhos, acessados somente quando necessário.

Funciono melhor em ambientes “clutter-free”, com o mínimo possível de distrações.

Agora eu troquei esse computador por um Mac Book, mas ainda vale o registro da disposição.

Isso não é regra, claro. Pelo contrário: tomando por base as mesas já recebidas, é notável como a maioria se rende a um enfeite, uma lembrança, algum toque, mínimo que seja, de personalização — o Anakin Skywalker na mesa do Julian Fernandes, os Padrinhos Mágicos na do Caio Alexandre ou o capacete do Master Chief na do João Paes Neto. Outras mesas seriam dignas de aparecerem em revistas de decoração como a do Matheus Bonela ou o escritório doméstico classudo do Victor Benincasa, para ficar em dois exemplos.

Se for pra decorar a mesa com bonequinhos, tenha bom gosto e coloque um do Star Wars.

Chama a atenção, também, as necessidades para o trabalho ou apenas por hobby. Imagino que o Harlley Sathler seja alguém muito ligado à música — seria uma explicação para a mesa de som que ele tem grudada na parede, imediatamente acima dos monitores.

A exemplo das mochilas, o envio de mesas de trabalho também é aberto a qualquer interessado. Nesse caso, o e-mail para ghedin@manualdousuario.net deve ter como assunto “Mesa de trabalho” e seguir essas instruções:

• Foto grande da mesa. No mínimo em 1440×810, ou seja, proporção 16:9; quanto maior, melhor. Dicas: prefira tirar a foto de dia, com o auxílio do Sol, e se tiver uma câmera dedicada, prefira-a em vez da do smartphone.

• Local. Onde fica a sua mesa, em casa ou na empresa/escritório? (Se for no seu local de trabalho, por favor, verifique com seu chefe antes se não tem problema. A última coisa que eu quero é causar a demissão de um leitor!) E se for numa empresa e puder, informe também o nome dela.

• Descrição dos itens. O que tem na mesa, por que essas coisas estão nela, o que é legal/se destaca entre elas... enfim, explique-a para nós. Em texto corrido, com no máximo 500 palavras. (Use o Word ou Google Docs para monitorar o limite.)

Conclusão

Essas seções, a das mochilas e a das mesas, são legais também por outro aspecto: a colaboração. Eu não sei muita coisa nem sou tão curioso quanto deveria, então ajusto o Manual do Usuário para ser um diálogo, não um megafone. Não existe ali aquele estilo professoral clássico, dos autores escrevendo umas verdades e os comentários existirem apenas por inércia, ignorados. Lançamos discussões abertas com o objetivo, também, de aprender.

Receber as mochilas e mesas é um aprendizado constante. Cada uma traz consigo um insight novo, uma forma diferente de resolver problemas; cada uma delas abre uma conversa legal entre o dono da mochila ou mesa, quem faz o site e aqueles que o leem.

Não é o todo da nossa linha editorial, mas é uma parte importante e querida, mesmo que às vezes passe um tempo no limbo pela falta de participação (é difícil, eu sei).

Veja todas as mochilas já publicadas no Manual do Usuário neste link. Aqui, neste outro, estão todas as mesas.


publicado em 18 de Julho de 2016, 19:04
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Rodrigo Ghedin

Escreve sobre tecnologia, estuda comunicação e vive tentando entender a convergência dessas duas áreas. Está à frente do Manual do Usuário, um blog de tecnologia diferente. Ele não sabe consertar seu computador.


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