Papo de Centro Cirúrgico 4 - A volta dos que não foram

Ô seus pelassacos, o PdH tá papo cabeça demais pro meu gosto, então toma Papo de Centro Cirúrgico versão 4 pra descontrair.

A falta de pressa é a inimiga do picareta

Já falei aqui de um colega picareta com quem trabalhei. O cara fazia migué pra tudo, dizia que não operava só pra não ter que ir para o centro cirúrgico, o almoço dele durava cinco horas, essas coisas. E eu só aturando os pepinos gerados pelo cara.

Mas, como diria uma ex-administradora da minha clínica, chega o dia que o dia chega.

Calhou que um dos colegas de plantão tinha ido para um congresso e o picareta estava só esperando um colega rendê-lo para podrt sair mais cedo e ir a uma festa. Nisso, chegou uma fratura exposta de perna, combinada com fratura fechada de tornozelo – ou seja, ao menos a exposta teria que ser operada. Como eu precisava de auxílio, o picareta teve que vir comigo. Era o dia da vingança.

Ele precisava sair  uma hora depois do momento em que o paciente foi anestesiado. E eu enrolando:


  • Para diminuir a contaminação, fazemos a limpeza de nossos braços com degermante por cerca de três minutos. Demorei dez.

  • Uma fratura exposta deve ser limpa e lavada meticulosamente, com pelo menos dez litros de soro fisiológico. Usei uns 18 litros e ainda instruí a enfermeira a cortar o bico do soro de modo a deixar apenas um filete sair – ou seja, cada frasco demoraria uma eternidade para esvaziar. Além disso, a meticulosidade dobrada também consumia tempo.

  • Ao pedir para a circulante me trazer o fixador externo, fiquei deliberadamente indeciso entre vários.

  • Normalmente, ao posicionar o fixador, você tem critérios flexíveis para aceitar o resultado final. Optei pela perfeição, o que sempre demora mais.

  • A cada vasinho que sangrava, eu parava tudo e ia coagular. Dependendo do sangramento, isso não é necessário.

  • Ao fechar a pele, eu errava todos os nós do fio de sutura, antes de acertá-los.

Enquanto eu fazia a cirurgia mais meticulosa, limpa e precisa da história do SUS, mil vezes mais do que o mínimo que deveria ser feito, o cara se desesperava e eu ria por dentro. Então, veio a crème de la crème.

A fratura exposta era uma emergência, mas havia uma fratura fechada que teoricamente poderia ser ficar como estava e seria operada pelo serviço de rotina. Numa ação caridosa, ordenei à circulante que trouxesse o material para essa cirurgia, pois assim o paciente sairia da mesa com o problema todo resolvido – uma boa ação me nos custaria mais uma horinha... Ops.

No meio da segunda cirurgia, já completamente louco, ele começa a pedir para chamar o substituto, que deveria ter chegado. Mas a circulante volta com a resposta: “Ele não está”. E só liberei no final do procedimento.

Pobre picareta, chegou umas três horas atrasado em sua festa.

Querida, hoje tive que resolver um pepino enorme lá no hospital...

Já que falei nos pepinos que esse cara arrumava, não posso deixar de contar uma história que já contei aqui no PdH sobre um uso alternativo de pepinos, e outros vegetais de formato fálico, por via retrógrada. Aconteceu nesse mesmo hospital.

Falo de um empalamento. Quando isso acontece, a roda da fofoca é implacável, todo o nosocômio fica sabendo. Fui avisado pelo técnico de Raio-X. Eu até desci para ver a radiografia do cara e, assim, acabei desc0brindo que pepinos não aparecem em radiografias.

O vegetal já havia sido retirado das entranhas do indivíduo e, meus caros, tinha que ser MUITO MACHO pra atochar um pepino king size daquele no próprio toba. Assustador!

Depois, naturalmente, imperaram as piadas sobre pepinos a serem resolvidos no plantão e, acredite se quiser, tinha salada de pepino no almoço. Não sei porque quase ninguém comeu...

Eu sei o que vocês estão pensando, seus imundos, mas é uma boca. A história completa está aqui.
Eu sei o que vocês estão pensando, seus imundos, mas é uma boca. A história completa está aqui.

Desconfie de perguntas estranhas no pós-operatório

Retirar coisas de dentro de seres humanos requer certos cuidados. Uma vez, quase deu merda!

Um staff medalhão de renome do hospital onde fiz residência entrou com dois colegas residentes numa cirurgia para a retirada de uma placa e parafusos do púbis de um paciente do sexo masculino. Por haver sinais de infecção, primeiro se retira o material, e depois, limpa-se a infecção.

Então após a retirada, o staff não conseguia encontrar a infecção, ou seja, o pus. Continuou dissecando até que viu uma estrutura amarelada que parecia o local infectado. Triunfante, gritou:

“Aqui está o pus!!”

Pegou uma goiva (instrumento semelhante a um alicate), cravou no “pus” e puxou. Uma estrutura tipo corda veio surgindo e, ao final dela, uma outra estrutura tipo uma bola.

Pra quem não entendeu: o cara puxou o funiculo espermático do paciente e a bola... era um testículo! Rapidinho, ele botou a bola lá pra dentro e ninguém comentou o assunto.

Epílogo: como o cara só puxou, sem arrebentar, ficou tudo bem. O mais suspeito foram os colegas fazendo o pós-operatório e perguntando ao paciente se estava tudo bem, se estava tudo funcionando direitinho...

A placa retirada virou chaveiro de um outro colega.

Boca de bêbado não tem dono

Bolas amarelas me remetem à festa da minha formatura. O porre que tomei nessa festa foi tão épico que minha turma lembra disso até hoje. Quando fui ver as fotos, não lembrava de ter tirado metade delas.

Mas ganhamos um café da manhã no Hotel Sheraton e, então, o que restou de mim foi pra lá. Cambaleando, ainda consegui fazer meu prato. Quando olho as opções, vi umas bolinhas amarelas.

“Oba, pão de queijo!!”. E enchi meu prato delas.

Quando fui comer, era um treco gelado e gorduroso, nada semelhante a um pão de queijo... Deixei de lado e voltei pra casa sem saber o que era aquilo.

Fui descobrir quase um ano depois, num carnaval em Porto Seguro. Acordei tranquilo depois da noitada e fui tomar café. Quando olho, lá estão elas, as mesmas bolinhas amarelas de um ano atrás!

Eu tinha comido manteiga pura.

"Ibituruna, a manteiga dos momentos mais profundos"

Falando em manteiga, essa aconteceu durante a residência médica do guitarrista da minha banda.

Durante muito tempo, uma noitada clássica daqui do Rio era a "noite dos solteiros" que rolava sempre às quartas numa casa noturna do Centro. Um dos nossos tinha acabado de se dar bem e estava num canto da casa, aos amassos com a incauta. O resto do povo, querendo ir embora, foi avisar o cara que estávamos de saída.

O cidadão estava com as mãos por dentro do sutiã da moça e nem se dignou a retirá-las para se despedir: fez o gesto de tchau por debaixo da blusa mesmo, para gargalhada geral.

Mas a história não termina aí. Ao rebocá-la para o alojamento (alojamentos de residentes são verdadeiras alcovas), eis que ela resolve propor uma "experiência alternativa ao convencional". Digamos, um tipo de sexo que necessita lubrificação extra. E pergunta se o cara tem KY ou coisa do tipo.

Não tinha, mas pra não perder a oportunidade, ele dá uma revista rápida no quarto e encontra no frigobar um pote salvador: Manteiga Ibituruna!

"Ah, vai tu mesmo!!"

E lá se foi a manteiga fazer as vezes de KY.

Lógico que esse feito acabou caindo na boca do povo do alojamento com todos os detalhes técnicos.

O pessoal do restaurante nunca entendeu o porquê daquele grupo de residentes sempre comentar a marca da manteiga:

"se for Ibituruna a gente não quer, não, porque vai estar contaminada!"

Link YouTube | Se o seu exame de próstata não é assim, então está faltando amor no seu médico.

Pão de queijo, uma comida para todos os momentos

Falei do barangueiro mais acima, e ele volta neste causo. O assunto é pão de queijo.

Muitas vezes, ficamos preocupados em não falar besteiras para as mulheres que pegamos e tal, mas essa que o cara falou merecia o fim da relação.

Estava ele nos preparativos finais para o coito e solta a seguinte pérola:

“Agora vou colocar meu pão de queijo no seu forninho!!!”

Terrível, mas acabou colocando mesmo.

Médico: alguém de ego tão avantajado que faz pouco publicamente das mulheres que dão em cima dele

Voltando às fêmeas, lembrei de uma boa história que não sei por que não contei nos episódios anteriores deste Papo de Centro Cirúrgico. Aliás, são duas histórias sobre o mesmo tema: as declarações de amor mais “exóticas” que eu já recebi de pacientes/colegas de trabalho.

A primeira foi de uma paciente minha, guria de 13 anos que tratei de uma fratura de braço, e que gamou nimim. (Putz, pedofilia é crime, tô fora). O gesso que fazemos para esse tipo de fratura tem que ser trocado constantemente, e toda vez, eu disse toda vez que fazia a troca, o gesso voltava com um coraçãozinho com o meu nome escrito. Engenhosa a menina.

A outra foi uma auxiliar de enfermagem com quem trabalhei no Exército. Vivia me chamando para almoçar e dando outros moles, mas como era, digamos, pouquíssimo aprazível em termos morfológicos, declinei. Não satisfeita, ela fez algo que acho que ninguém jamais fará por mim novamente....

Ao ganhar um filhote pastor alemão, batizou o bichinho com meu nome e sobrenome.

Fiquei até lisonjeado de ter um homônimo canino, mas ela não me conquistou com essa criatividade.

Em tempo: O pobre Maurício Pessoa pegou uma doença misteriosa e morreu ainda jovem. Juro que não foi praga minha.

Como médicos se veem: "Foto minha na sala de operação. Sou o barbudinho. Nem preciso usar máscara pois minha respiração é naturalmente pura."
Como médicos se veem: "Foto minha na sala de operação. Sou o barbudinho. Nem preciso usar máscara pois minha respiração é naturalmente pura."

Gente que se gaba de enganar os outros depois vai querer operar seu fígado

Criatividade era a marca de alguns colegas médicos, especialistas em balonismo. Naturalmente, estou falando da arte de dar balão em suas respectivas namoradas.

Um plantão ou cirurgia extra já era convincente o bastante, mas tinha um colega, estagiário do departamento médico do Vasco da Gama, que se superava nas armações.

Um belo dia, ele disse para a namorada que iria acompanhar a equipe de futsal num torneio no Espírito Santo. Botou o uniforme e pediu para que ela o levasse ao estádio do clube. Se despediram. Ele entrou no estádio, foi para o vestiário, trocou de roupa,e foi encontrar os amigos que estavam de carro do outro lado do estádio. Destino: Oktoberfest de Blumenau.

Mas a genialidade não está nisso. O “torneio no Espírito Santo” não foi à toa: o pai dele estava justamente numa viagem ao Espírito Santo:

“Pai, compra alguma coisa escrito “lembrança do Espírito Santo” para eu dar depois pra minha namorada!!”

Gênio do crime.

Mentir e rir da vítima, as marcas do cavaleiro moderno

Outro colega meu poderia escrever um livro sobre balonismo. Sua tática já começava perfeita, porque ele tinha um alias para a noitada. Sempre dava nome falso em seus balões. Renato, no caso.

Estava saindo com uma incauta ciumenta e ela sempre marcando em cima. Um belo dia, ela o acusa de estar com outra, ele nega e ela:

“Eu sei que você está com outra... NINGUÉM ME ENGANA NÃO, RENATO!!!”

Aqui ele quase se traiu, porque a vontade de rir da cara dela era imensa!

O bom mentiroso mente falando a verdade

Esse mesmo colega juntou-se a outro mestre do balonismo e inventaram um congresso no Paraná para irem juntos. Só que o verdadeiro congresso era novamente em Blumenau, um pouco mais ao sul, e um pouco mais etílico, em outubro.

Na época, o fake Renato estava solteiro, mas o outro tinha namorada. Quando voltaram, a namorada do cara foi buscá-los no aeroporto, e resolveu ter uma crise de ciúme. Pressionou para saber o que eles tinham armado. E ela enchia o saco, acusando os dois de terem armado aquilo tudo e querendo saber “a verdade”.

Então, meu amigo solta o verbo:

“Você quer saber a verdade? Vou te contar então. Nós inventamos esse congresso e fomos para a Oktoberfest pegar mulher. Pronto, falei.”

O golpe foi tão certeiro e inesperado que a resposta foi:

“Ah, mentira. Duvido que ele tivesse coragem de fazer isso comigo!!!”

E tudo acabou bem. Quem disse que traição só acontece com mentiras?

Tem gente que só larga o osso quando não tem mais osso

Mas teve uma menina que se estrepou ao dar balão no namorado. Foi sair com o amante, caíram de moto, e ela teve uma fratura exposta no pé, perdendo até um osso.

Fiquei sabendo de tudo porque o bucha aqui é que teve que operá-la às 3 da matina.

Gostaria de saber qual foi a desculpa que ela deu pro corno. E o pior é que não teve nem como reconstruir o osso perdido.

Como um médico se olha no espelho de manhã: "bom dia, doutor, pronto pra salvar vidas, encantar meninas e educar putas?"
Como um médico se olha no espelho de manhã: "bom dia, doutor, pronto pra salvar vidas, encantar meninas e educar putas?"

Olhem como sou legal: faço caridade no puteiro

Pra fechar uma última história de Oktoberfest.

Uma quarta feira em Blumenau, noitada meio morna, fim de noite, zero a zero, um bando de machos bêbados. Alguém sugeriu irmos zoar num puteiro. E fomos.

Chegando lá, uma das moças cisma comigo e começa a falar besteira no meu ouvido. Resolvo então consumir (ou consumar, sei lá). Um erro grosseiro e crasso, porque eu estava trêbado e depois de certo nível alcóolico, a coisa não funciona nem por decreto. Too drunk to fuck.

Não estava funcionando mesmo, mas a incauta não ajudava. Teimava em fazer o bola gato com o meu amigo encapado – algo que na ausência da capa costuma ser infalível. Pedi que ela fizesse rapidinho sem capa, só pra eu conseguir atingir uma consistência maior que a gelatina que estava, mas ela não topou.

Já que estávamos ali mesmo, começamos a trocar uma idéia e o assunto caiu no HIV. Dei algumas orientações médicas, tirei algumas dúvidas, até que o tempo acabou e desci.

Quase argumentei que não tinha conseguido nada, mas imagina você cheio de cana nas idéias tendo que confrontar dois leões de chácara que têm o seu tamanho só no bíceps? Capitulei, admiti a derrota, paguei o preju. Bem feito.

Ao menos serve de consolo o comprometimento com a profissão médica. Qual colega pode dizer que pagou do próprio bolso para dar aula sobre HIV/AIDS por aí? Quero ver me chamar de mercenário depois dessa!


publicado em 04 de Setembro de 2011, 07:42
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Mauricio Garcia

Flamenguista ortodoxo, toca bateria e ama cerveja e mulher (nessa ordem). Nas horas vagas, é médico e o nosso grande Dr. Health.


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